“Não podemos ter um orçamento paralelo em 2021”, afirma Bruno Funchal. Para ele, os gastos contra a covid-19 devem ficar restritos apenas ao ano de 2020

O secretário do Tesouro Nacional, Bruno Funchal, demonstrou preocupação com o fechamento das contas públicas neste fim de ano e reconheceu que o grande desafio do governo federal será não levar as despesas contraídas durante a pandemia da covid-19 para 2021. Apesar de o Orçamento do ano que vem ainda não ter sido debatido pelo Congresso, o técnico criticou a ideia de um novo Orçamento de Guerra.

“Não podemos ter um orçamento paralelo em 2021. Precisamos voltar à normalidade. E essa volta é tão importante quanto as reformas estruturais”, afirmou Funchal, nesta terça-feira (24/11), durante a abertura de evento organizado pelo órgão para setoriais de contabilidade, II Econt 2020. O técnico, entretanto, não fez menção à ameaça de uma segunda onda de contágio de covid-19 batendo à porta de vários países e começa a ser percebida em algumas capitais brasileiras sem que o país tenha conseguido controlar a primeira onda.

“Os deveres de casa para este ano são fechar 2020 e fazer a virada de página para voltarmos a ter um ano de boa gestão fiscal, com todo mundo voltando a discutir as reformas estruturantes, as reformas fiscais. Se elas eram importantes quando a dívida estava em 75% do PIB (Produto Interno Bruto), agora, com 96% do PIB, é muito mais importante”, disse Funchal. Ele defendeu a gestão fiscal “como um dos pilares para o país voltar a crescer de forma sustentável” e criticou os erros do passado, quando despesas temporária acabaram se tornando permanentes.

“A gente observa que, historicamente, quando tem uma crise e essas ações políticas se perpetuam para lidar com problemas temporários acabam se tornando permanentes. Não podemos ter esse transbordamento”, disse. Ele lembrou que, em relação à última crise financeira global, “a conta está sendo paga até hoje”.

Rombo fiscal

Na avaliação do secretário, um dos maiores desafios do governo está sendo administrar dois orçamentos, o inicial, que previa um deficit primário de R$ 124,1 bilhões, algo entre 1,6% e 1,8% do PIB; e o paralelo, que deverá encerrar o ano com um rombo fiscal acima de R$ 800 bilhões, algo entre 11% e 12% do PIB. “O momento é muito impar. 2020 foi um ano extremamente duro, um ano excepção, que o mundo inteiro foi atingido por um choque inesperado. Esse ano foi um ano desafiador, não só para a gestão pública, mas a gestão de todo mundo”, destacou.

“O país vinha reduzindo o deficit, e vinha tendo uma virada esperada para superavit entre 2022 e 2023. E, hoje, nosso deficit vai ficar de 11% a 12% do PIB. O gasto foi muito expressivo e essa reorganização da gestão fiscal acaba sendo mais importante do que nunca. É tão ou mais importante do que as próprias reformas para colocar o país nos trilhos neste final de ano. É fundamental definirmos os próximos 10 anos da economia brasileira”, destacou ele, citando a necessidade de discussão do Orçamento de 2021, que ainda não foi iniciada pelo Congresso.

Fontes do Legislativo contam que, provavelmente, não haverá instauração da Comissão Mista de Orçamento (CMO) e que a pauta orçamentária será encaminhada diretamente para o Plenário do Congresso.

Credibilidade do mercado

Para Funchal, a reorganização da gestão fiscal é “mais importante do que nunca”. Contudo, ele não detalhou como o governo pretende reestruturar as contas públicas e recuperar perda de credibilidade do mercado, uma vez que o Tesouro não vem conseguindo fazer a rolagem da dívida pública com juros mais baixos.

Nesta semana, o mercado continua apostando em alta nos futuros e cobram prêmios de risco cada vez mais elevados para os títulos que o Tesouro tenta colocar no mercado para financiar o rombo crescente do governo federal e com a inflação em alta, correndo o poder de compra da população.

Na segunda (23), apesar de o ministro da Economia, Paulo Guedes, tentar passar tranquilidade ao mercado durante três pronunciamentos ao longo do dia, agentes financeiros continuaram desconfiados sobre a capacidade do governo conseguir reequilibrar as contas públicas devido à falta de clareza nas falas do chefe da equipe econômica sobre como ele pretende cumprir a regra do teto — emenda constitucional que limita o aumento das despesas à inflação do ano anterior — e criar um novo programa de renda mínima dentro do Orçamento.

Não à toa, pelas estimativas da Instituição Fiscal Independente (IFI), o governo dever continuar fechando as contas no vermelho, pelo menos, até 2030. E, no cenário base, a dívida bruta pública vai crescer ano a ano, chegando a 100% do PIB em 2024.

Via Correio Braziliense