Solução de Consulta Interna é criticada por advogados por supostamente reduzir o montante de ICMS a ser abatido

 

A Receita Federal publicou nessa terça-feira (24/10) uma Solução de Consulta Interna por meio da qual explicita como deve ser feita a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins pelos contribuintes que possuem decisões transitadas em julgado sobre o assunto. O texto, porém, tem sido alvo de críticas por advogados por restringir o montante a ser abatido, podendo, segundo tributaristas, gerar mais discussões na esfera administrativa e judicial.

O entendimento vem pouco mais de 1 ano e meio após o Supremo Tribunal Federal (STF) ter decidido que o imposto não entra no cálculo das contribuições. A Solução de Consulta, que deve orientar a atuação dos funcionários da Receita Federal, foi editada após a Coordenação-Geral de Tributação da Receita ser questionada sobre o assunto por outra divisão da própria entidade.

De acordo com a Solução de Consulta Interna Cosit 13/2018, para o cumprimento de decisões que tratam da exclusão do ICMS da base do PIS e da Cofins que transitaram em julgado as pessoas jurídicas devem abater da base de cálculo das contribuições o imposto efetivamente recolhido, e não o destacado na nota fiscal. “Faz-se necessário que seja segregado o montante mensal do ICMS a recolher, para fins de se identificar a parcela do ICMS a se excluir em cada uma das bases de cálculo mensal da contribuição”, define o texto.

Na prática, de acordo com advogados ouvidos pelo JOTA, o texto reduz o valor que pode ser abatido, já que o ICMS efetivamente recolhido pode sofrer compensações com créditos acumulados em operações anteriores. Tributaristas apontam que até então acreditavam que o abatimento deveria ter como base o imposto destacado na nota. Algumas empresas, segundo eles, vinham se portando dessa forma.

“O ICMS destacado na nota é diferente do ICMS pago. O contribuinte, na prática, faz o pagamento do ICMS a partir do momento em que ele compensa [o imposto com] os créditos”, diz o advogado Alessandro Mendes Cardoso, do escritório Rolim, Viotti e Leite Campos.

“Matematicamente [o ICMS pago] sempre vai ser menor”, completa o José Eduardo Toledo, do escritório Toledo Advogados.

Já a advogada Mírian Lavocat, do Lavocat Advogados, comenta que o ICMS repassado ao consumidor é o destacado na nota fiscal. “Efetivamente houve um fato gerador e um destaque na nota fiscal”, afirma

Diferente do Supremo?

Para além de questionamentos quanto ao ICMS que pode ser abatido, tributaristas apontam que o entendimento da Receita iria contra o que foi decidido pelo Supremo em março de 2017, após a análise do RE 574.706.

Em seu voto, por exemplo, a ministra Carmen Lúcia, que relatou o processo, afirma que “embora se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, todo ele, não se inclui na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal, pelo que não pode ele compor a base de cálculo para fins de incidência do PIS e da COFINS”.

Para tributaristas, o fato pode gerar recursos nas esferas administrativa e judicial. “Isso vai gerar um contencioso gigantesco novamente, porque esse critério, no meu entendimento, não é o que o Supremo falou”, comentou o advogado Pedro Guilherme Accorsi Lunardelli, do Advocacia Lunardelli.

Ao justificar a edição da Solução de Consulta, por outro lado, a Receita Federal elenca outros pontos da decisão do Supremo que excluiu o ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins. A entidade defende que a ministra Carmen Lúcia cita trechos de obras do de Roque Antonio Carrazza e Aliomar Baleeiro. O último teria defendido que “a parcela correspondente ao ICMS pago não tem, pois, natureza de faturamento (e nem mesmo de receita), mas de simples ingresso de caixa (na acepção supra), não podendo, em razão disso, compor a base de cálculo quer do PIS, quer da COFINS”.

Em outro ponto, a magistrada afirma que “o ICMS incide sobre todo o valor da operação, pelo que o regime de compensação importa na circunstância de, em algum momento da cadeia de operações, somente haver saldo a pagar do tributo se a venda for realizada em montante superior ao da aquisição e na medida dessa mais valia, ou seja, é indeterminável até se efetivar a operação”.

Além disso, segundo a Receita, outros ministros, ao se posicionarem em 2017, teriam apontado que o ICMS a ser abatido seria o efetivamente pago. Procurada, a entidade não retornou até a publicação dessa matéria o pedido de esclarecimentos enviado pelo JOTA.

Saldo credor

A Solução de Consulta, ainda segundo tributaristas, gera outro temor: de que, por mais que o texto valha apenas para contribuintes que têm ações judiciais que transitaram em julgado, empresas sejam autuadas por, após a decisão do STF, terem retirado da base de cálculo do PIS e da Cofins o ICMS destacado na nota.

Isso porque, segundo advogados, algumas empresas podem estar abatendo da base do PIS e da Cofins o ICMS destacado, e não o efetivamente pago. A atitude pode gerar autuações caso a Receita opte por utilizar o entendimento presente na Consulta também para operações que ocorreram após a decisão do STF no RE 574.706.

Na prática o entendimento poderia até mesmo impedir que companhias se aproveitassem do precedente favorável da Suprema Corte. “Uma empresa com saldo credor [de ICMS] não teria direito a restituir o PIS e a Cofins”, afirma Lunardelli.

 

Via Jota Info