Governo tenta buscar maneiras na Justiça para recuperar o dinheiro de equipamentos que nunca chegaram ao Estado

Os cofres do governo catarinense ainda não viram a cor do dinheiro gasto na compra dos respiradores. O caminho para tentar recuperar todo o valor é tortuoso. Passa por bloqueios judiciais de contas dos envolvidos no escândalo até uma remota chance de reintegração de uma quantia avaliada em R$ 12 milhões, que estaria na China.

Segundo o procurador-geral do Estado de Santa Catarina, Luiz Dagoberto Corrêa Brião, no início de abril, por meio das procuradoras do Estado Jocélia Aparecida Lulek e Jéssica Campos Savi, a PGE (Procuradoria-Geral do Estado) entrou com uma ação e conseguiu deixar um depósito judicial em torno de R$ 13,4 milhões.

Além disso, há outros R$ 483,2 mil bloqueados das contas da empresa Veigamed, resultado de uma ação popular do deputado estadual Bruno Souza (Novo). A Justiça encontrou apenas esse valor na conta da empresa.

“O Estado não pode dispor desse dinheiro, até porque as empresas envolvidas no processo recorreram, principalmente aquela dos R$ 11 milhões”, disse o procurador.

A empresa que Birão se refere é a Oltramed, companhia de equipamentos médicos em Joinville, que recebeu esse valor da Veigamed pela compra de 100 mil kits para teste rápido da Covid.

Em setembro do ano passado, a PGE solicitou a transferência dos valores depositados judicialmente para a conta do Estado, via Fundo Estadual de Saúde, a fim de que os recursos já pudessem ser utilizados pela saúde. No entanto, a Justiça entendeu que os valores não poderiam ser transferidos antes da decisão final.

A complicada recuperação de dinheiro na China

Para Brião, o mais complicado deverá ser recuperar os R$ 12 milhões que, possivelmente, foram para a China. De acordo com o procurador-geral, o valor corresponde a compra de 150 respiradores e não dos 200.

“Esse é mais complicado, não é impossível. Dessa parte estamos levando ao MPF (Ministério Público Federal) que detém acordos internacionais para repatriação de valores, principalmente o de valores ilícitos”, explicou.

E ainda onde estariam outros poucos mais de R$ 6 milhões? Segundo Brião, estariam teoricamente no Brasil. Ele não quis entrar em detalhes, porém se mostrou otimista em recuperar essa quantia. “Já temos o alvo e está em andamento”, afirmou.

Há ainda opiniões controversas quanto à quantidade de respiradores que se encontram em um galpão na China. A TS Eletronics – contratada pela Veigamed para a importação dos 200 aparelhos – informou, no início deste ano, que tinham 150 aparelhos na Ásia. A fabricante chinesa teria advertido que se os equipamentos não fossem retirados, iriam vender os aparelhos, devido ao custo de manutenção no depósito.

Segundo a TS, os 150 respiradores foram realocados em outro galpão, e que a mesma teria a intenção de vender no mercado internacional e repassaria o dinheiro (retirando os custos dela) para o governo do Estado.

O procurador-geral do Estado, no entanto, discordou da informação repassada pela TS. “Nos autos disse que estavam em posse de 50 respiradores em um depósito na China e tenta vendê-los para, posteriormente, depositar os valores nos autos”, contou Brião.

Brião disse ter esperança de recuperar parte dos valores que podem estar na China. “Nós temos na China 50 respiradores, que são daqueles que não interessam para o Estado. Eles dizem: ‘está aqui sua mercadoria’. E dizem mais: ‘olha, nós podemos vender aqui e entregar o dinheiro para vocês’”, lembrou o procurador.

“Claro que o mercado daquela vez foi de R$ 165 mil cada respirador e eu imagino que nem a metade desse valor vamos conseguir vender. Essa é uma situação chatinha. Uma coisa fique certa eu vou buscar. Não vou prometer pegar tudo, mas vou buscar”, comentou.

Catarinense se sentiu roubado

Sem citar nomes, o procurador-geral disse que houve uma sucessão de erros na compra dos respiradores, em especial, a inexperiência dos secretários que estavam no comando das decisões e a falta de alguém que tivesse pulso firme para não autorizar a transação.

“Secretários jovens, então sentindo uma pressão, não sabiam o que viria pela frente. Se imaginou gente morta pelas calçadas, um cenário de terror. Eu imagino que essas pessoas entraram em parafuso. Nesse cenário chegam os espertalhões e impõem a vontade deles”.

“Essa gente veio de fora, muito sabido, se reúne com uns espertalhões daqui e tentam muitas vezes e conseguem surrupiar o nosso dinheiro”, disse Brião – Foto: Reprodução/ND“Essa gente veio de fora, muito sabido, se reúne com uns espertalhões daqui e tentam muitas vezes e conseguem surrupiar o nosso dinheiro”, disse Brião – Foto: Reprodução/ND

“Não era para ter acontecido. Às vezes falta alguém que bata na mesa e diga: ‘não faço’, foi isso que faltou. As pessoas que participaram tinham que ter batido na mesa e dizer que não vamos fazer isso. No mínimo, foram ingênuos, sob pressão erraram”, avaliou.

A condução do governo de Carlos Moisés na crise acabou resultando na abertura de uma comissão parlamentar de inquérito na Assembleia Legislativa e, em seguida, na abertura de um processo de impeachment. Moisés está afastado desde o dia 26 de março e será julgado pelo Tribunal de Julgamento nesta sexta-feira (7).

Brião lembrou que a ação judicial para recuperar o dinheiro é de relevância social para Santa Catarina. “Essa gente veio de fora, muito sabido, se reúne com uns espertalhões daqui e tentam muitas vezes e conseguem surrupiar o nosso dinheiro. As pessoas se sentem roubadas. Não estou dizendo que alguém roubou, mas a sensação é essa”, finalizou.

Via ND+