A medida provisória (MP) que amplia o leque de investimentos sem a alíquota do Imposto de Renda (IR) para não residentes no Brasil deve impulsionar a entrada de recursos externos no país. No entanto, esse efeito não será evidente no curto prazo.

A possibilidade de compra dos títulos no exterior, a baixa de liquidez no nosso mercado, os indexadores utilizados no cenário doméstico e questões cambiais podem adiar o fluxo esperado.

Pelo lado da infraestrutura, no entanto, a MP pode ajudar na captação de recursos por grupos que participam de leilões do setor.

Segundo analistas, a iniciativa é considerada positiva, já que iguala as condições ao que já é praticado no mercado de renda variável e no de títulos públicos, onde não há cobrança dos tributos aos não residentes.

Algumas particularidades do mercado local tendem a arrefecer a entrada do capital de estrangeiros no curto prazo, principalmente, no mercado de emissão de dívidas.

A maior parte dos títulos privados emitidos no mercado doméstico está atrelada a um indexador pós-fixado, como CDI ou IPCA. A característica pode causar estranheza aos estrangeiros, mais habituados a títulos prefixados. Dessa forma, eles podem continuar preferindo alocar seus recursos nos títulos públicos.

– Nos ativos de crédito direto, não vejo um fluxo relevante no curto prazo, até porque as emissões das companhias são de menor porte, o volume do nosso mercado é menor, e é mais difícil atender a demanda de recursos – disse o sócio e gestor de crédito privado da Galápagos Capital, Gilberto Paim.

A expectativa é que os estrangeiros deem preferência para empresas com boa classificação de risco. Mas boa parte delas já consegue acessar o mercado internacional por meio da emissão de bônus.

Com isso, esses investidores podem preferir assumir esse risco no mercado externo, que eles conhecem mais, em vez do local.

– Eles tendem a começar a investir nas melhores empresas e eles têm acesso por lá, com mais liquidez e uma regulação que eles já entendem – disse Paim.

O mercado de dívida privada vem crescendo nos últimos anos. Em 2022, mesmo com a volatilidade vista nas taxas de juros e o período eleitoral, diversas empresas já realizaram emissões.

Segundo dados da Associação Brasileira das Entidades dos Mercados Financeiro e de Capitais (Anbima), volume captado em debêntures foi de R$ 180,189 bilhões até agosto em 2022, contra R$ 137,5 bilhões de janeiro a agosto de 2021.

Um dos fatores que explica o fortalecimento do mercado local foi o fechamento da janela para emissões no exterior, diante das incertezas em relação ao processo de elevação nas taxas de juros pelo Federal Reserve, Banco Central americano.

Ainda assim, o nosso mercado é considerado menos líquido na comparação com o exterior.

Segundo analistas, outro fator que pode limitar o apetite dos estrangeiros para os títulos privados locais é o risco cambial, principalmente na compra de debêntures, com a necessidade de operações de hedge (proteção) contra possíveis oscilações.

No longo prazo, a maior presença do estrangeiro pode gerar mudanças no mercado de dívida interno, já que trata-se de um player diferente e com visão de mais longo prazo.

– Ao fazer esse movimento, você traz um investidor mais qualificado, mais demanda para os ativos locais e o resultado disso pode ser uma queda de spread. Isso não vai ser imediato, é um processo em que o investidor externo vai se educar em relação ao mercado local, e que vai impulsionar que novas empresas passem a participar do mercado de capitais – afirmou o gestor de crédito da Western Asset, Adriano Casarotto.

Apoio à infraestrutura

 

A MP estende a isenção a outras classes de ativos, como títulos emitidos por instituições financeiras; letras financeiras; rendimentos auferidos por cotistas nas aplicações em fundos de investimento em participações em infraestrutura.

Se a entrada de recursos para o crédito privado pode levar mais tempo, os especialistas observam como positivo o movimento para alavancar projetos de infraestrutura.

– Ajuda no financiamento das empresas e dos grupos que participam dos leilões. Esses grupos às vezes precisam de financiamento e ele não é diretamente ligado a um ativo especifico, como uma rodovia. Você permitir que os estrangeiros aportem com isenção de imposto ajuda na infraestrutura – disse Casarotto.

Paim, da Galápagos, destaca que os fundos de investimento em participações em infraestrutura são pensados para investimentos de mais longo prazo, o que tende a atrair o maior interesse estrangeiro.

– Alguns grandes grupos de investidores e fundos de pensão que têm interesse nesse tipo de operação podem operar por meio desses fundos.

Fonte: O GLOBO