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De acordo com Zeca Farenzena, presidente do Sindicato dos Fiscais da Fazenda do Estado de Santa Catarina (Sindifisco), o governador eleito Jorginho Mello (PL), que toma posse em 1º de janeiro, vai encontrar uma situação nos cofres catarinenses a partir de 2023.

Em entrevista exclusiva concedida ao jornalista Marcos Schettini, Farenzena expõe que três dos principais segmentos da arrecadação de SC já registraram diminuição significativa de alíquota de ICMS por conta da MP 255/2022, quando a energia elétrica, combustíveis e telecomunicações passaram de uma tributação do ICMS de 25% para 17%, o que já está causando uma redução mensal de pelo menos R$ 300 milhões.

Neste sentido, os fiscais da Fazenda de SC deverão ter protagonismo para garantir que o futuro governador Jorginho Mello possa cumprir todas as obrigações sem aumentar impostos. Ainda, durante a entrevista, o presidente do Sindifisco de Santa Catarina comentou sobre as ações da entidade em 2022 e apontou a importância da arrecadação tributária. “Sem ela, o Estado não tem meios de oferecer serviços essenciais, realizar obras, obter financiamentos externos. Sem arrecadação, não há Estado, não há cidadania e não há civilização”, disse Zeca Farenzena. Confira:

 

Marcos Schettini: Qual a realidade do cofre do Estado de SC hoje?

Zeca Farenzena: Santa Catarina vai bem quando o assunto é saúde financeira, e essa realidade não é de hoje. Há mais de uma década, o Estado se mantém com arrecadação acima da média nacional. A realidade do cofre, como você diz, é reflexo de diversos fatores, dentre os quais podemos citar a excelência nas carreiras típicas de Estado responsáveis por receita, despesa e controle do gasto público; o trabalho conjunto com outros poderes e instituições; a parceria, no passado, com governantes que entendiam a importância do trabalho dos fiscais para a construção de boas políticas tributárias; a relação harmônica entre fisco e contribuinte e suas instituições representativas (a mentalidade de punir foi superada pela cultura de prevenir e orientar). Todos estes fatores ajudaram a construir um ambiente mais atrativo e com maior segurança jurídica para o investimento. Conseguimos trazer mais empresas e negócios para Santa Catarina, e isso também ajudou a alimentar um círculo virtuoso para a economia estadual.

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Schettini: Arrecadação é saúde financeira?

Zeca Farenzena: Precisamos ter um olhar mais amplo sobre a questão para compreender que a saúde financeira do Estado depende de uma série de outros fatores como, por exemplo, a gestão equilibrada do gasto e da dívida pública. Mas não tenho dúvidas de que a arrecadação é a parte primordial, essencial desse complexo mecanismo, visto que dela depende a manutenção dos serviços públicos, o duodécimo dos Poderes, a manutenção das contas de muitos municípios. Pode parecer simples demais, mas se não tivermos arrecadação, não teremos mais Estado e, principalmente, os serviços públicos dos quais depende toda população catarinense.

Schettini: A sonegação é uma doença que mata?

Zeca Farenzena: A sonegação é uma doença letal: mata aquele empresário que trabalha corretamente e cumpre honestamente com suas obrigações tributárias, destrói setores econômicos, destrói a livre e leal concorrência empresarial, mata a geração de emprego formal, fomenta o desvio de recursos do Estado para alimentar toda forma de corrupção, prejudica o desenvolvimento dos municípios. Por isso, o combate à sonegação fiscal, às empresas noteiras e aos planejamentos tributários abusivos, há muito, vem sendo uma obsessão dos fiscais da Fazenda que, de forma pioneira e por meio do desenvolvimento de sistemas próprios, permitem monitorar de maneira especializada cada segmento econômico e identificar a ocorrência destas práticas criminosas.

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Schettini: O presidente eleito quer distribuir renda. Arrecadar impostos tem algo a ver com isso?

Zeca Farenzena: Arrecadação de impostos tem tudo a ver com a questão da distribuição mais eficaz da renda. Acredito que a percepção da necessidade de melhor distribuição de renda e riqueza é universal e independe da orientação política de cada um. Existe alguém, em sã consciência, que goste de ver um semelhante passando fome, sem moradia, sem oportunidade de trabalho? Qualquer pessoa, seja presidente ou não, deveria ser favorável a melhorar a vida dos mais vulneráveis, especialmente quando falamos de um país com dimensões continentais e ainda com enormes desigualdades no acesso às oportunidades. A tributação precisa evoluir muito nesse sentido. Segundo dados da Receita Federal, a tabela do imposto de renda fechará o ano com defasagem aproximada de 150%, ou seja, quem recebe menos paga mais imposto sobre renda. Dividendos não são tributados na pessoa física, apenas na jurídica. Historicamente, a política tributária brasileira incide muito sobre a produção e o consumo, e pouco sobre a renda – característica comum aos países menos desenvolvidos e mais desiguais.

Faria total sentido uma reforma tributária “solidária”, que não aumente, mas sim que modifique e redistribua a carga tributária. Menos tributação na indústria e no comércio e mais tributação sobre a renda, como acontece nos EUA, Canadá, Alemanha, Japão. Seria uma forma efetiva e perene de distribuição de renda e financiamento de projetos sociais, sem a necessidade de, a cada dois, três anos, precisarmos discutir, em meio a tensão e disputas políticas, pacotes de auxílio as pessoas em situação de vulnerabilidade social e alimentar.

Schettini: Qual a realidade do Sindifisco e sua importância em relação à cidadania?

Zeca Farenzena: O Sindifisco vem há 34 anos, apesar de suas limitações, sendo um indutor da evolução da carreira de fiscal da Fazenda Estadual, estimulando ações de educação continuada, atuando junto ao Legislativo no esclarecimento de questões tributárias, junto aos gestores na formulação de políticas públicas relacionadas à arrecadação, fiscalização e desenvolvimento econômico. Em paralelo, o sindicato apoia causas ligadas à educação, como o Projeto Integrar, que já possibilitou o ingresso de centenas de jovens de baixa renda à universidade. Acredito também que nossa atuação contribui permanentemente para a difusão do conhecimento geral sobre a importância dos tributos para manutenção de um estado diferenciado no contexto nacional.

Schettini: O governador de SC que assume em 2023 tem qual dimensão financeira?

Zeca Farenzena: O novo governador vai encontrar uma situação diferente, em que três dos principais segmentos da arrecadação tiveram diminuição significativa de alíquota de ICMS por conta da MP 255/2022. Energia elétrica, combustíveis e telecomunicações passaram de uma tributação do ICMS de 25% para 17%, o que já está causando uma redução mensal de pelo menos R$ 300 milhões. Não por sorte, mas graças a muito trabalho e proficiência técnica, Santa Catarina vem se preparando sempre para as crises, que são cíclicas. E esse trabalho será novamente muito necessário: encerraremos o ano com cerca de R$ 600 milhões de déficit e, embora tenhamos projeção de arrecadação mensal na casa dos R$ 3,5 bi, mais de 80% das despesas são vinculadas e obrigatórias. Esse cenário requer inteligência, criatividade e gestão criteriosa. Mais uma vez, o Fisco catarinense deverá ter protagonismo para garantir que o governador eleito possa cumprir todas as obrigações sem aumentar imposto.

Schettini: Existe relação entre a arrecadação tributária e a prestação de serviços públicos ao cidadão?

Zeca Farenzena: Existe total relação. Em 2021, o Poder Executivo repassou aproximadamente 22% da arrecadação líquida ao Legislativo, Judiciário, Ministério Público, TCE, Udesc; 50% da arrecadação do IPVA e 25% da arrecadação de ICMS aos municípios; aplicou R$ 5,91 bilhões na saúde, R$ 4,96 bi na educação, R$ 2,95 bi em segurança pública, R$ 1 bi em infraestrutura. Tudo isso é serviço público ao cidadão. É o recurso financeiro necessário para viabilizar Poderes e órgãos atuantes, garantindo o direito à cidadania para todas as pessoas, 295 prefeituras com capacidade de investimento local, saúde, educação e segurança para os cidadãos. Sem arrecadação tributária, o Estado não tem meios de oferecer serviços essenciais, realizar obras, obter financiamentos externos. Sem arrecadação, não há Estado, não há cidadania e não há civilização.

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Schettini: Quais são, hoje, os desafios dos fiscais da Fazenda e, nesse contexto, qual é o papel do Sindifisco?

Zeca Farenzena: Os fiscais da Fazenda vão encontrar 2023 com redução importante de ICMS nos três setores econômicos atingidos pela MP 255 e precisarão buscar compensações sem aumento de impostos. É uma equação complexa, especialmente porque não houve gradatividade ou planejamento nesta redução que, embora tenha aspectos de justiça social e tributária, não se reflete tão positivamente, no médio prazo, se houver perdas consequentes na entrega dos serviços públicos prestados pelo Estado ao cidadão. O papel do Fisco será buscar caminhos para compensar essa redução, e um deles passa pela cobrança dos devedores contumazes, aqueles que sabem que possuem um valor de tributos a serem pagos, mas que, reiteradamente, deixam de fazê-lo porque enxergam nessa prática uma forma de lucrar mais ou até mesmo de se financiar. Recentemente a Federação Nacional do Fisco apontou que os débitos, de empresas e pessoas físicas, inscritos na dívida ativa dos estados brasileiros cresceram 45% de 2015 a 2021 e devem ultrapassar, em 2022, a marca de R$ 1 trilhão. Os dados fazem parte do Atlas da Dívida Ativa. Este, certamente, é um grande desafio, mas também uma oportunidade de obter recursos financeiros em benefício de toda sociedade.

 

Via Lê Notícias – Coluna Satélite Marcos Schettini