Antes de pedido de vista, André Mendonça e Rosa Weber acompanharam o voto de Fachin. Entenda o julgamento

O ministro Gilmar Mendes, do Supremo Tribunal Federal (STF), pediu vista e interrompeu o julgamento das três ações que discutem o início da cobrança do diferencial de alíquota (Difal) de ICMS. Antes da suspensão, o placar estava em 5X2 para que a cobrança seja válida apenas a partir de 2023.

Com o pedido de vista, não há data para o caso ser retomado. No entanto, depois de atualização realizada pelo STF no plenário virtual, os demais ministros poderão antecipar seus votos até as 23h59 desta sexta-feira (11/11), quando o julgamento seria finalizado.

O Difal do ICMS discutido nas ações é cobrado em operações envolvendo mercadoria destinada a consumidor final não contribuinte do imposto em outro estado. Nessa modalidade de cobrança, a exemplo do que ocorre no comércio eletrônico, o fornecedor do bem ou serviço é responsável por recolher todo o imposto e repassar ao estado do consumidor final o Difal do ICMS – isto é, a diferença entre a alíquota interna do estado de origem e a alíquota interestadual.

O julgamento busca definir se a lei complementar que regulamentou a cobrança precisa observar as anterioridades nonagesimal e anual para começar a produzir efeitos. Trata-se da LC 190/22, publicada em 5 de janeiro de 2022.

Em seu voto, o relator, ministro Alexandre de Moraes, concluiu que a LC 190/22 não institui ou majora tributo e, portanto, não precisa observar as anterioridades. No entanto, Moraes entendeu que é constitucional o dispositivo segundo o qual as novas definições de contribuinte, local e momento do fato gerador do Difal do ICMS podem produzir efeitos no primeiro dia útil ao terceiro mês subsequente ao da disponibilização do portal do Difal. Trata-se do artigo 24-A, parágrafo quarto, da Lei Kandir (LC 87/96), incluído pela LC 190/2022. Na prática, isso pode validar a cobrança desde março ou abril de 2022. Isso porque há uma discussão sobre o dia em que o portal começou a valer – 29/12/21 ou 1/1/22.

Na última sexta (4/11), o ministro Dias Toffoli divergiu parcialmente do relator ao reconhecer a legitimidade do legislador em determinar expressamente a observância da noventena. Caso o entendimento de Toffoli prevaleça, a cobrança será válida a partir de 5 de abril de 2022.

Por fim, na segunda-feira (7/11), Fachin divergiu do relator e concluiu que a lei corresponde à instituição ou majoração de tributo e, assim, que deve observar as duas anterioridades. Na prática, isso autoriza a cobrança a partir de 2023. Fachin foi acompanhado até agora pelos ministros Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, André Mendonça e Rosa Weber.

Restituição do Difal do ICMS?

Caso a divergência aberta por Fachin prevaleça, os contribuintes, em tese, poderão pedir restituição dos valores relativos ao Difal do ICMS pagos indevidamente ao longo de 2022. O tributarista Eduardo Pugliese Pinceli, sócio do Schneider Pugliese, explicou, porém, que existe uma questão de ordem prática que pode dificultar a restituição. Para receber a restituição, as empresas (contribuintes de direito) precisarão comprovar que não repassaram o custo do tributo aos consumidores (contribuintes de fato) ou ter uma autorização expressa destes para receber os valores.

Essa regra consta do artigo 166 do Código Tributário Nacional (CTN). Segundo esse dispositivo, “a restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la”.

“Se realizou o pagamento ao longo de 2022, como o ICMS é um imposto indireto, a empresa tem de provar que não repassou o custo do tributo no preço dos bens e serviços ao consumidor. Se a empresa fez o pagamento, é muito provável que a discussão passe pelo tema da prova efetiva do não repasse ou pela necessidade de autorização expressa do contribuinte para a restituição”, explica o advogado.

Segundo Pugliese, poderá haver exceção para o caso de contribuintes que estão fazendo o depósito do tributo nos autos de mandados de segurança, por exemplo. O STJ possui precedentes no sentido de que, nessa hipótese, não cabe a aplicação do artigo 166 do CTN. Esse entendimento foi firmado no REsp 547706/DF e no REsp 1377781/MG, por exemplo.

O advogado Saul Tourinho Leal, sócio do sócio do escritório Ayres Britto e representante da Abimaq na ADI 7066, afirma que a expectativa é que haja respeito aos “direitos fundamentais dos contribuintes”.

“A maioria até aqui verificada segue a perspectiva de respeito integral aos direitos fundamentais dos contribuintes. A vista é um direito regimental que assiste a cada ministro e ministra da nossa Suprema Corte. Cabe a nós aguardar”, diz.

A tributarista Julia Ferreira Cossi Barbosa, do escritório Finocchio & Ustra Advogados, também avalia que, mesmo com o pedido de vista do Gilmar Mendes, o placar definido até agora traz a esperança para as empresas de que a cobrança seja válida apenas a partir de 2023. Para a advogada, a cobrança em 2022, exigida por todos os estados e o Distrito Federal, é “claramente inconstitucional”, uma vez que, a seu ver, os anterioridades nonagesimal e anual devem ser observadas.

Via Jota