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Presidente do Banco Central reconhece que alta de preços está mais forte que o previsto. Para analistas, Selic pode ir a 14%

 A alta de 1,62%, em março, no Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que mede a inflação oficial, surpreendeu o mercado e o presidente do Banco Central (BC), Roberto Campos Neto. Com isso, foi desencadeada uma nova onda de revisões das estimativas para os índices do custo de vida e os juros, ambos para cima, ampliando as apostas de que o BC não conseguirá cumprir a meta inflacionária deste ano e do próximo.

“A inflação do índice mais recente foi uma surpresa. Eu tinha mencionado a velocidade mais rápida da passagem do aumento do combustível na bomba, e parte foi isso. Mas houve outros elementos, como vestuário e alimentos (que tiveram altas de preços). Essa surpresa se fez em vários países, mas a realidade é que nossa inflação está muito alta e os núcleos estão muito altos, além de ser mais persistente”, disse o presidente do BC, ontem, em evento virtual organizado por TC Mover e Arko Advice.

De acordo com Campos Neto, como ainda há defasagem nos preços dos combustíveis no mercado interno, ele e os demais diretores do BC devem analisar melhor os dados na próxima reunião do Comitê de Política Monetária (Copom), marcada para 3 e 4 de maio. “Vamos analisar os fatores que estão gerando essas surpresas inflacionárias e comunicar no momento mais apropriado”, afirmou. Na última reunião do Copom, a taxa básica de juros (Selic) foi elevada em um ponto percentual, para 11,75% ao ano, e o BC sinalizou que fará, no próximo mês um ajuste da mesma magnitude, para 12,75%.

Salto

Em março, de acordo com o IBGE, o IPCA acelerou e atingiu 1,62%, frente à alta de 1,01% de fevereiro, acumulando salto de 11,30% em 12 meses. Foi a maior variação para o mês desde março de 1994, pouco antes do início do Plano Real. Nos três primeiros meses do ano, o IPCA avançou 3,20%, e já encostou na meta de inflação determinada pelo Conselho Monetário Nacional (CMN) para o ano, cujo teto é de 5%.

Um dado preocupante apontado por Campos Neto, que reforçou a afirmação de que a inflação não é de oferta, mas de demanda, foi a disseminação da alta de preços. O índice de difusão subiu de 75% para 76%, de fevereiro para março. Quando está tão espalhado assim, o dragão inflacionário é difícil de conter.

A surpresa do presidente do BC com o IPCA de março reforçou as apostas de que a inflação anual continuará acima de 10%, pelo menos, até julho ou agosto. Pelas estimativas do Itaú Unibanco, a inflação continuará persistente e disseminada e o BC elevará a Selic até agosto. O banco manteve em 13,75% a previsão para a Selic em dezembro.

“A inflação continua persistente e é bem provável que o IPCA continue em dois dígitos até julho”, apostou Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust Gestora de Recursos. Ele lembrou que, mesmo se o BC elevar a Selic para 13%, a inflação continuará em torno de 8% no fim do ano. “Por conta dessa pressão inflacionária, é provável que 14% seja o piso para a Selic”, acrescentou.

A economista Alessandra Ribeiro, sócia da Tendências Consultoria, disse que ainda não revisou as projeções após o dado do IPCA, divulgado na sexta-feira, mas demonstrou otimismo com a efetividade da política monetária conduzida pelo BC, que iniciou o ciclo de ajuste em março de 2021, após a Selic atingir o piso histórico de 2% ao ano. “O BC está bem adiantado no processo e não acho que será necessário um piso de 14% para a Selic. O Copom pode ainda elevar mais os juros, mas vai colher os frutos da alta iniciada no ano passado.”

Sem espaço

Sergio Vale, economista-chefe da MB Associados, destacou que, apesar da surpresa de março, a alta do IPCA não deverá se repetir em abril e em maio. Contudo, ele alertou que não vê espaço para o BC cumprir a meta de inflação neste ano e no próximo. “Tem pressão de medicamentos, que pode trazer riscos para uma inflação de 7,8% no fim do ano, que é o que esperamos. Acho que o BC vai continuar subindo a Selic e não deverá parar em 12,75% como tinha sinalizado. Vai ter que subir mais nas próximas reuniões”, disse Vale, que prevê a taxa básica em 13,50% no fim do ano. Pelas estimativas da MB, o IPCA encerrará 2023 em 4,2%, quando o centro da meta será de 3,25% e o teto, de 4,75%.

Em 2021, o BC não cumpriu a meta de inflação pela sexta vez desde o início do regime de metas, em 1999. Pelos cálculos de Eduardo Velho, da JF Trust, a inflação estrutural do Brasil é, tradicionalmente, acima de 4%, e, portanto, qualquer meta abaixo desse patamar dificilmente será cumprida. “As metas deste ano e do próximo já estão comprometidas”, resumiu.

Via Correio Braziliense