Este artigo estuda a base de cálculo do Imposto sobre a Transmissão Causa Mortis – ITCMD, nos casos de doação de cotas de capital de sociedade empresária, assim como sua definição, características e contornos legais, utilizando-se como base o entendimento Jurisprudencial e Doutrinário, bem como as normas previstas na Constituição Federal, no Código Tributário Nacional e legislação do Estado de São Paulo.

quarta-feira, 31 de outubro de 2018

1 Introdução

Antes de ingressar no ponto principal deste estudo, qual seja, a base de cálculo do ITCMD nos casos de doação de cotas de capital de sociedade empresária, é necessário delimitar alguns pontos indispensáveis para a compreensão da matéria, uma vez que envolve não só aspectos de direito tributário, mas também de direito societário e civil.

Primeiramente devem ser observados alguns aspectos importantes em relação ao referido tributo, tais quais: o conceito, a abrangência, limitações de incidência e sua relação com o direito societário, à luz dos princípios constitucionais e regras previstas no Código Tributário Nacional e no Código Civil, da forma como vem sendo interpretado pela doutrina e jurisprudência.

  1. Características do ITCMD. Competência e hipóteses de incidência.

Os tributos como bem se sabe, seguindo por base a definição exposta no artigo 3º1 do Código Tributário Nacional, são prestações em dinheiro exigidas de maneira compulsória pelos entes políticos, não constituindo sanção de ato ilícito, e devendo ser devidamente instituídos por lei.

Tais tributos, são divididos pela Constituição Federal em diferentes espécies, como meio de distribuir a competência entres os entes federativos e melhor atender as necessidades da sociedade, classificando-se os tributos em: impostos, taxas, contribuições de melhoria, contribuições em geral e empréstimos compulsórios.

O imposto de transmissão causa mortis e doação (ITCMD) é um imposto de competência exclusiva dos Estados e do Distrito Federal, conforme o disposto no inciso I do art. 1552 da Constituição Federal.

 

O art. 155, §1º, III, da Constituição Federal determina que o ITCMD será regido por lei complementar, devendo ser instituído especificamente na forma do art. 146, III, “a”3. No plano infraconstitucional, o imposto vem sendo parcialmente regido pelo Código Tributário Nacional (CTN, arts. 35 a 42)4, recepcionado como lei complementar pela Constituição Federal de 1988, e legislação estadual Paulista (lei Estadual 10.705/00).

 

Quanto a normatividade complementar deve ser registrada a exceção dos casos previstos no art. 155, § 1º, III, da Constituição Federal, nos quais não se verificam disposições do CTN para regular as seguintes situações: a) se o doador tiver domicilio ou residência no exterior; b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve seu inventário processado no exterior.

 

Nesses casos a omissão do Código Tribunal Nacional não foi suprida, razão pela qual, a inexistência de lei Complementar a regular o tema, tem levado os tribunais a declarar a inconstitucionalidade de legislações estaduais, como pode ser visto no Recurso Extraordinário 851.108, pendente de decisão no Supremo Tribunal Federal e afetado ao regime de repercussão geral.5

 

Os impostos segundo Leandro Paulsen6, “[…] são tributos que incidem, necessariamente, sobre revelações de riqueza do contribuinte.”.

 

No mesmo sentido o art. 16 do Código Tributário Nacional dispõe: “Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte. ”

Assim, é cabível uma análise do que realmente seria a hipótese de incidência do ITCMD, dividindo e cotejando suas particularidades, delimitando os pontos importantes que formam os contornos legais do referido imposto, especialmente a base de cálculo.

Segundo Paulsen:

“Transmissão é transferência jurídica, implicando a sucessão na titularidade do bem ou direito. Será causa mortis quando ocorra por força do falecimento real ou presumido do titular. […] A doação também implica transferência de titularidade de bem ou direito, mas decorrente ato jurídico inter vivos a título gratuito7.”

Portanto, o ITCMD tem como hipótese de incidência fatos verificáveis a partir de duas situações: i) o falecimento real ou presumido do titular dos direitos ou bens transmitidos, ou; ii) pela doação, que nada mais é que a transferência de certos bens ou direitos a terceiro de forma gratuita.

Tal imposto, no Estado de São Paulo, é regido pela lei 10.705/00, que prevê em seu inciso 2º, as hipóteses de incidência:

Artigo 2º – O imposto incide sobre a transmissão de qualquer bem ou direito havido:

I – por sucessão legítima ou testamentária, inclusive a sucessão provisória;

II – por doação.

  • 1º – Nas transmissões referidas neste artigo, ocorrem tantos fatos geradores distintos quantos forem os herdeiros, legatários ou donatários.
  • 2º – Compreende-se no inciso I deste artigo a transmissão de bem ou direito por qualquer título sucessório, inclusive o fideicomisso.
  • 3º – A legítima dos herdeiros, ainda que gravada, e a doação com encargo sujeitam-se ao imposto como se não o fossem.
  • 4º – No caso de aparecimento do ausente, fica assegurada a restituição do imposto recolhido pela sucessão provisória.
  • 5º – Estão compreendidos na incidência do imposto os bens que, na divisão de patrimônio comum, na partilha ou adjudicação, forem atribuídos a um dos cônjuges, a um dos conviventes, ou a qualquer herdeiro, acima da respectiva meação ou quinhão.

Da mesma forma o artigo 3º baliza que:

Artigo 3º – Também sujeita-se ao imposto a transmissão de:

I – qualquer título ou direito representativo do patrimônio ou capital de sociedade e companhia, tais como ação, quota, quinhão, participação civil ou comercial, nacional ou estrangeira, bem como, direito societário, debênture, dividendo e crédito de qualquer natureza;

II – dinheiro, haver monetário em moeda nacional ou estrangeira e título que o represente, depósito bancário e crédito em conta corrente, depósito em caderneta de poupança e a prazo fixo, quota ou participação em fundo mútuo de ações, de renda fixa, de curto prazo, e qualquer outra aplicação financeira e de risco, seja qual for o prazo e a forma de garantia;

III – bem incorpóreo em geral, inclusive título e crédito que o represente, qualquer direito ou ação que tenha de ser exercido e direitos autorais.

  • 1º – A transmissão de propriedade ou domínio útil de bem imóvel e de direito a ele relativo, situado no Estado, sujeita-se ao imposto, ainda que o respectivo inventário ou arrolamento seja processado em outro Estado, no Distrito Federal ou no exterior; e, no caso de doação, ainda que doador, donatário ou ambos não tenham domicílio ou residência neste Estado.
  • 2º – O bem móvel, o título e o direito em geral, inclusive os que se encontrem em outro Estado ou no Distrito Federal, também ficam sujeitos ao imposto de que trata esta lei, no caso de o inventário ou arrolamento processar-se neste Estado ou nele tiver domicílio o doador.

O fato gerador do ITCMD se dá com “a transmissão de qualquer bem ou direito havido por sucessão legítima ou testamentária (v.g., quando ocorre o falecimento), ou, quando ocorre a doação, ato inter vivos”.

Necessário evidenciar que segundo o §1º do supracitado artigo 3º, da lei 10.705/00, o fato gerador do ITCMD ocorre distintamente para cada herdeiro, legatário ou donatário, ou seja, havendo dois ou mais herdeiros, haverá a ocorrência do fato gerador distintivamente para cada uma das respectivas transmissões.

A função do ITCMD é fiscal. Ele tem a finalidade de gerar recursos financeiros para os cofres públicos, sobre a revelação de riqueza do contribuinte. Isto não quer dizer que o imposto não possa ter função extrafiscal. Todo tributo pode. No caso do imposto sobre heranças e doações, a função extrafiscal possível consiste em desestimular o acúmulo de riqueza, ou, em outras palavras, desestimular a concentração de renda8.

 

Código Civil em seu art. 538, refere-se à doação como o contrato em que uma pessoa, por liberdade, transfere bens ou vantagens do seu patrimônio para outra, fixando um conceito expresso para tal instituto.

 

Já sobre a transferência causa mortis, o Código Civil, não traz uma definição expressa, mas trata tal questão em seus artigos 1.784 e seguintes, discorrendo sobre os métodos de sucessão e consequentemente como ocorrem. Observe-se:

Art. 1.784. Aberta a sucessão, a herança transmite-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários.

Art. 1.785. A sucessão abre-se no lugar do último domicílio do falecido.

Art. 1.786. A sucessão dá-se por lei ou por disposição de última vontade.

Art. 1.787. Regula a sucessão e a legitimação para suceder a lei vigente ao tempo da abertura daquela.

Art. 1.788. Morrendo a pessoa sem testamento, transmite a herança aos herdeiros legítimos; o mesmo ocorrerá quanto aos bens que não forem compreendidos no testamento; e subsiste a sucessão legítima se o testamento caducar, ou for julgado nulo.

Art. 1.789. Havendo herdeiros necessários, o testador só poderá dispor da metade da herança.

Art. 1.790. A companheira ou o companheiro participará da sucessão do outro, quanto aos bens adquiridos onerosamente na vigência da união estável, nas condições seguintes:

I – se concorrer com filhos comuns, terá direito a uma quota equivalente à que por lei for atribuída ao filho;

II – se concorrer com descendentes só do autor da herança, tocar-lhe-á a metade do que couber a cada um daqueles;

III – se concorrer com outros parentes sucessíveis, terá direito a um terço da herança;

IV – não havendo parentes sucessíveis, terá direito à totalidade da herança.

Em tais situações a ausência de onerosidade é traço comum entre as transmissões9, ou seja, o ITCMD na maioria dos casos irá incidir sobre uma revelação de riqueza que foi transmitida gratuitamente, sem que o seu titular (doador/sucedido) tenha recebido qualquer valor em troca.

Os contribuintes do ITCMD são definidos pelo art. 7º da lei paulista, que é bem clara ao dispor:

Artigo 7º – São contribuintes do imposto:

I – na transmissão “causa mortis”: o herdeiro ou o legatário;

II – no fideicomisso: o fiduciário;

III – na doação: o donatário;

IV- na cessão de herança ou de bem ou direito a título não oneroso: o cessionário.

Parágrafo único – No caso do inciso III, se o donatário não residir nem for domiciliado no Estado, o contribuinte será o doador.

Da mesma maneira, a base de cálculo do ITCMD se encontra estabelecida nos arts. 9º e 10º, demarcando que será o valor venal, ou seja, o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação. Na transmissão causa mortis, o valor do bem ou direito “é o atribuído na avaliação judicial e homologação pelo Juiz10”. Confira-se:

Artigo 9º – A base de cálculo do imposto é o valor venal do bem ou direito transmitido, expresso em moeda nacional ou em UFESPs.

  • 1º – Para os fins de que trata esta lei, considera-se valor venal o valor de mercado do bem ou direito na data da abertura da sucessão ou da realização do ato ou contrato de doação.
  • 2º – Nos casos a seguir, a base de cálculo é equivalente a:
  1. 1/3 (um terço) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio útil;
  2. 2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa do domínio direto;
  3. 1/3 (um terço) do valor do bem, na instituição do usufruto, por ato não oneroso;
  4. 2/3 (dois terços) do valor do bem, na transmissão não onerosa da nua-propriedade.
  • 3º- Na hipótese de sucessivas doações entre os mesmos doador e donatário, serão consideradas todas as transmissões realizadas a esse título, dentro de cada ano civil, devendo o imposto ser recalculado a cada nova doação, adicionando-se à base de cálculo os valores dos bens anteriormente transmitidos e deduzindo-se os valores dos impostos já recolhidos. (Acrescentados os §§ 3º e 4º pelo inciso I do art. 2º da lei 10.992 de 21/12/2001; DOE 22/12/01; efeitos a partir de 01/01/02)
  • 4º – Para a apuração da base de cálculo poderá ser exigida a apresentação de declaração, conforme dispuser o regulamento.

Artigo 10 – O valor do bem ou direito na transmissão “causa mortis” é o atribuído na avaliação judicial e homologado pelo Juiz.

  • 1º – Se não couber ou for prescindível a avaliação, o valor será o declarado pelo inventariante, desde que haja expressa anuência da fazenda, observadas as disposições do artigo 9º, ou o proposto por esta e aceito pelos herdeiros, seguido, em ambos os casos, da homologação judicial.
  • 2º – Na hipótese de avaliação judicial ou administrativa, será considerado o valor do bem ou direito na data da sua realização.
  • 3º – As disposições deste artigo aplicam-se, no que couber, às demais partilhas ou divisões de bens sujeitas a processo judicial das quais resultem atos tributáveis.

Por fim, referente à alíquota do ITCMD, determina o art. 155, §1º, inciso IV11 da CF, a responsabilidade do Senado Federal para a sua fixação máxima; determinação que foi atendida pela Resolução 9/92 ao instituir o teto de 8% (oito por cento).

 

Da mesma forma, o art. 2º12 da Resolução 9/92 relata que as alíquotas poderão ser progressivas conforme o quinhão que cada herdeiro receber, nos termos da Constituição Federal. Em outras palavras, as alíquotas irão variar conforme a capacidade contributiva de cada contribuinte, quanto maior a riqueza transmitida, maior poderá ser a tributação.

 

Insta ainda observar que obviamente: “Não se aplica imposto sobre transmissão causa mortis e Doação – ITCD nos bens pertencentes à viúva meeira, pois ela não é herdeira, incidindo o imposto somente sobre a meação partilhável13”.

 

Em linhas gerais, estas são as características básicas do imposto sobre a transmissão causa mortis, e doação, ou seja, a hipótese de incidência; sujeitos, ativo e passivo; sua base de cálculo; alíquota, informações necessárias para se prosseguir no estudo, adentrando ao ponto principal do trabalho.

 

  1. A base de cálculo do ITCMD na doação e sucessão de quotas de capital de sociedade empresária.

Estabelecidas as características básicas que formam o ITCMD, chega-se enfim ao ponto principal do estudo, qual seja, a base de cálculo do imposto sobre a transmissão causa mortis e doação de quotas de capital de sociedade empresária.

Logo de início deve ser observado que as ações de sociedades anônimas que sejam negociadas em mercado aberto, possuem critério diferente de valoração.

Descreve o art. 981 do Código Civil que: “Celebram contrato de sociedade as pessoas que reciprocamente se obrigam a contribuir, com bens ou serviços, para o exercício de atividade econômica e a partilha, entre si, dos resultados”.

A sociedade empresária é a reunião de pessoas que tem como objetivo exercer profissionalmente atividade econômica organizada para a produção ou circulação de bens ou serviços, visando ao final certo resultado (geralmente lucro).

Edilson Enedino das Chagas elucida o conceito de sociedade empresária, afirmando o seguinte: “Podemos conceituar a sociedade como a entidade resultante do acordo de vontade de duas ou mais pessoas que se comprometem a reunir capital e trabalho para a realização de operações com fins lucrativos14”.

 

Neste diapasão o art. 982 do Código Civil discorre o sequente: “Salvo as exceções expressas, considera-se empresária a sociedade que tem por objeto o exercício de atividade própria de empresário sujeito a registro (art. 967); e, simples, as demais.”

 

Logo, tem-se que o art. 1.05515 do CC, relata que o capital social da sociedade empresária divide-se em quotas que podem ser iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio, isto é, podendo cada sócio possuir mais de uma quota de capital.

De tal afirmação retira-se o entendimento de que as quotas de capital social nada mais são do que instrumentos utilizados para dividir e discriminar a contribuição dos sócios na formação do capital social, delimitando a participação de cada um na sociedade empresária, assim como (regra geral) para a distribuição do lucro auferido.

A evolução natural do capital inicial investido na sociedade empresária será registrada através de seu patrimônio líquido que medirá, em moeda corrente, a dinâmica evolutiva patrimonial e sua correspondência com a participação de cada sócio em sua composição.

Por outras palavras: após a constituição do capital social, o valor patrimonial de cada quota de capital da sociedade empresária poderá evoluir ou regredir, conforme a mutação do patrimônio líquido que, por sua vez, mede a mutação do capital social originalmente investido através do acúmulo de resultados positivos ou negativos, gerados em cada exercício social.

Desta forma, tendo claro o que são as quotas de capital, o art. 3º, I, da lei 10.705/00, prevê que o ITCMD além das situações previstas no já citado art. 2º, incide também nas seguintes situações:

Artigo 3º – Também sujeita-se ao imposto a transmissão de:

I – qualquer título ou direito representativo do patrimônio ou capital de sociedade e companhia, tais como ação, quota, quinhão, participação civil ou comercial, nacional ou estrangeira, bem como, direito societário, debênture, dividendo e crédito de qualquer natureza;

[…]

A previsão legal de incidência do ITCMD sobre as ações ou quotas de capital de sociedade empresária é clara, estando sua base de cálculo em tais situações prevista no art. 14, §3º16, da lei estadual, onde se evidencia que quando não ocorrer negociação sobre a quota, nos últimos 180 (cento e oitenta) dias, o valor da base de cálculo admitido será o respectivo valor patrimonial.

Repara-se que a lei estadual é omissa quanto à hipótese de ter ocorrido a negociação nos últimos 180 dias, não dispondo qual seria a base de cálculo do tributo em tal situação, abrindo caminho para uma interpretação extensiva, aplicando a tais casos a base de cálculo disposta no §1º do art. 14, que se aplica genericamente a todos os tipos de bens móveis ou imóveis. Note-se:

  • 1º – À falta do valor de que trata este artigo, admitir-se-á o que for declarado pelo interessado, ressalvada a revisão do lançamento pela autoridade competente, nos termos do artigo 11.

Concomitantemente o art. 15 preleciona o seguinte:

Artigo 15 – O valor da base de cálculo é considerado na data da abertura da sucessão, do contrato de doação ou da avaliação, devendo ser atualizado monetariamente, a partir do dia seguinte, segundo a variação da Unidade Fiscal do Estado de São Paulo – UFESP, até a data prevista na legislação tributária para o recolhimento do imposto. (Redação dada ao art. 15 pelo inciso III do art. 1º da lei 10.992 de 21/12/01; DOE 22/12/01; efeitos a partir de 01/01/02)

  • 1º – O valor venal de determinado bem ou direito que houver sido fixado em data distinta daquela em que ocorreu o fato gerador deverá ser expresso em UFESPs.
  • 2º – Para os fins do disposto no parágrafo anterior, será observado o valor da UFESP vigente na data da fixação do valor venal.
  • 3º – Não havendo correção monetária da UFESP, aplicar-se-á o índice adotado à época para cálculo da inflação, nos prazos já estabelecidos neste artigo.

Dessa forma, para o tema proposto importa definir o que seja “valor patrimonial” conforme dispõe o art. 14, § 3º, da lei Estadual Paulista 10.705/00, porquanto deverá ser este valor à base de cálculo do tributo na doação e/ou transmissão causa mortis de tais bens, ou seja, das quotas de capital de sociedades não negociadas em mercado aberto.

O problema que os contribuintes têm enfrentado está relacionado justamente com a delimitação desta expressão “valor patrimonial” que muitos interpretam como um conceito aberto e/ou indeterminado.

É de conhecimento geral que a Fazenda do Estado de São Paulo tem adotado entendimento no sentido de que o valor patrimonial das quotas de capital, deveria ser aferido mediante avaliação dos ativos da sociedade e não sobre o valor do patrimônio líquido.

Evidente que este critério desborda dos limites legais, já que não contempla, v.g., os passivos da sociedade que impactam o valor patrimonial das quotas de capital. Com efeito, uma sociedade pode possuir vultoso ativo, mas, também, passivo considerável de modo que o patrimônio líquido seja muito inferior ao valor desses ativos.

Portanto, o critério de avaliação, apenas, do ativo não corresponde ao conceito “valor patrimonial” utilizado pelo legislador para definir a base de cálculo, revelando notória ilegalidade na interpretação fazendária.

Parece que a melhor definição de “valor patrimonial” seja aquela que corresponda ao valor do patrimônio líquido da sociedade no momento da ocorrência do fato gerador, já que a expressão “valor patrimonial” remete exatamente ao conceito jurídico/contábil de patrimônio líquido, conforme está definido no art. 182 da lei 6.404/76.

É o entendimento adotado também pelo Banco Central do Brasil quando define “valor patrimonial” para as ações representativas de porção do capital social.

[…] Valor obtido mediante a divisão do valor do Patrimônio Líquido pela quantidade de ações ou quotas representativas do capital social integralizado, exclusive a quantidade de ações ou quotas em tesouraria.17

Dessa forma, o valor patrimonial das quotas de capital social de sociedade que não tem ações negociadas no mercado, pode ser aferido mediante a divisão do patrimônio líquido pelo número de quotas de capital social existentes na data da ocorrência do fato gerador.

A Jurisprudência do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, ao apreciar casos análogos, sedimentou o entendimento de que, consoante a legislação de regência do ITCMD, no caso de doação de quotas de sociedade, a base de cálculo do imposto é o valor patrimonial das quotas e não o valor dos ativos da sociedade.

Em tais situações, portanto, deve ser claro que o valor patrimonial, base de cálculo do ITCMD não será necessariamente igual ao valor nominal do capital social da sociedade, e nem tampouco correspondente ao valor do ativo.

Neste sentido tem-se as seguintes decisões:

APELAÇÃO CÍVEL – MANDADO DE SEGURANÇA Preliminares de inadequação da via eleita/impossibilidade jurídica do pedido afastadas Não se trata de impetração de mandado de segurança contra lei em tese, mas procedimento administrativo baseado em ato normativo infralegal (decreto) que teria extrapolado sua função regulamentar – Base de cálculo do imposto sobre transmissão causa mortis e doação (ITCMD) Quotas de sociedade limitada valor patrimonial Legislação que não especifica se deve ser utilizado o valor patrimonial contábil ou o valor patrimonial real da quota ausência de previsão legal que determine que o valor patrimonial da quota a ser utilizado como base de cálculo do ITCMD seja o valor patrimonial real, de forma que deve ser aceito o valor patrimonial contábil utilizado pelos impetrantes ausência de vedação legal à utilização do valor patrimonial contábil da quota no cálculo do ITCMD Sentença mantida Reexame necessário e recurso voluntário da Fazenda Estadual improvidos.

(TJ-SP – AC – 1005874-91.2016.8.26.0032, Relator (a): Maria Laura Tavares, Órgão Julgador: 5ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, Data do Julgamento: 18/12/2017, Data de Publicação: 02/02/2018).

Apelação e Reexame Necessário – Mandado de Segurança– ITCMD – Doação de quotas de capital social – Base de cálculo do tributo – Cálculo que deve recair sobre o valor patrimonial das ações e não o ativo que integra o patrimônio da empresa – Exegese do art. 14, parágrafo 3º,da Lei 10.705/2000 – Complementação do recolhimento do referido tributo – Inadmissibilidade – Observância ao princípio da legalidade – Presença do direito líquido e certo– Precedente deste Egrégio Tribunal de Justiça – Sentença de concessão da ordem mantida – Recursos oficial e voluntário improvidos.

(TJ-SP – AC – 1005873-09.2016.8.26.0032, Relator: Marcelo L Theodósio, Órgão Julgador: 11ª Câmara de Direito Público do Tribunal de Justiça de São Paulo, Data de Julgamento: 19/06/2018, Data de Publicação: 5/07/2018).

O valor nominal é o valor convencionado para cada ação/quota no momento de sua emissão/subscrição, já o valor patrimonial, por sua vez, é o quociente entre o patrimônio líquido da sociedade e o número de ações/quotas que compõem o capital social desta. Este quociente mostra a relação existente entre os bens e direitos, deduzidas as obrigações perante terceiros da sociedade empresária, tendo como resultado o patrimônio líquido e o valor de cada ação/quota18.

  1. Conclusão

Conclui-se então nesse breve estudo, que a base de cálculo para a incidência do ITCMD na doação/sucessão de quotas de capital social de sociedades cujos títulos representativos de capital social não são negociados no mercado deve corresponder ao valor patrimonial, que, por sua vez, é obtido mediante a divisão do Patrimônio Líquido da sociedade na data do fato gerador pelo número de quotas que compõem o Capital Social, seguindo aquilo que estabelece o art. 14, § 3º, da Lei nº. 10.705/00.

________________________

1 Art. 3º Tributo é toda prestação pecuniária compulsória, em moeda ou cujo valor nela se possa exprimir, que não constitua sanção de ato ilícito, instituída em lei e cobrada mediante atividade administrativa plenamente vinculada.

2 Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre: I – transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;

3 Art. 146. Cabe à lei complementar: […] III – estabelecer normas gerais em matéria de legislação tributária, especialmente sobre: a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, bases de cálculo e contribuintes;

4 Lei nº. 5.172, de 25 de outubro de 1966 – Código Tributário Nacional.

5 Clique aqui.

6 Paulsen, Leandro. Curso de direito tributário: completo / 6. ed. rev. atual. e ampl. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014. pg. 45

7 Paulsen, Leandro. Ob. cit, pg. 286.

8 Brito Machado, Hugo de. Curso de direito tributário. 35ª ed. rev. atual. e ampl. Malheiros Editores LTDA. 2014. pg. 366.

9 Paulsen, Leandro. Ob. cit. pg. 286

10 Paulsen, Leandro. Ob. cit. pg 292.

11 § 1º O imposto previsto no inciso I: IV – terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal;

12 Art. 2º. As alíquotas dos impostos, fixadas em lei estadual, poderão ser progressivas em função do quinhão que cada herdeiro efetivamente receber, nos termos da Constituição Federal.

13 STJ, AgRg no REsp 821.904/DF, set/2009.

14 Chagas, Edilson Enedino das. Direito empresarial esquematizado – 4. ed. – São Paulo: Saraiva, 2017. (Coleção esquematizado/coordenador Pedro Lenza). Pg. 157.

15 Art. 1.055. O capital social divide-se em quotas, iguais ou desiguais, cabendo uma ou diversas a cada sócio.

16 § 3º – Nos casos em que a ação, quota, participação ou qualquer título representativo do capital social não for objeto de negociação ou não tiver sido negociado nos últimos 180 (cento e oitenta) dias, admitir-se-á o respectivo valor patrimonial.

17 Clique aqui.

18 Clique aqui.

_________________________

Paulsen, Leandro. Curso de direito tributário: completo / 6. ed. rev. atual. e ampl. – Porto Alegre: Livraria do Advogado Editora, 2014. pg. 45

Brito Machado, Hugo de. Curso de direito tributário. 35ª ed. rev. atual. e ampl. Malheiros Editores LTDA. 2014. pg. 366.

STJ, AgRg no REsp 821.904/DF, set/2009

Chagas, Edilson Enedino das. Direito empresarial esquematizado – 4. ed. – São Paulo: Saraiva, 2017. (Coleção esquematizado/coordenador Pedro Lenza). Pg. 157.

Clique aqui

_________________________

*Vinícius Tovkan Pereira da Silva é estudante de Direito na FADAP. Colaborador no escritório Advocacia Ramos Fernandez.

 

*Hamilton Donizeti Ramos Fernandez é advogado. Mestre em Direito pela FADISP. Sócio Fundador da Advocacia Ramos Fernandez.

 

Via Migalhas