O Tribunal de Contas da União (TCU) fez ontem um ataque contra o volume de renúncias fiscais existentes na economia brasileiro. O relatório do ministro Vital do Rêgo colocou entre uma das 22 ressalvas o fato de que alguns desses benefícios tributários terem sido concedidos sem atender requisitos definidos por outras legislações, como a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).

As críticas às renúncias não se limitaram ao relator, que foi acompanhado por todos os seus colegas da Corte. O relatório foi aprovado em plenário por unanimidade e agora segue para o Congresso.

Segundo Rêgo, o excesso de benefícios tributários e creditícios afetaram o resultado das contas públicas em 2017. Esses benefícios foram estimados em R$ 354,7 bilhões para 2017. O ministro destacou que o montante representou mais de 30% da receita líquida do governo no período. “A renúncia fiscal é de tal magnitude que pode ter afetado o equilíbrio das contas públicas em 2017”, disse.

Para o ministro, se os benefícios fiscais do governo federal tivessem ficado na média do período 2003 a 2008 (em R$ 223 bilhões), o país teria obtido superávit primário de R$ 12 bilhões no ano passado, em vez de um déficit de R$ 118,4 bilhões. Rêgo destacou que a região Sudeste, com um valor per capita de R$ 1.887 em benefícios, é bem mais favorecido por do que a região Nordeste, que é mais pobre e ainda assim tem um volume de benefícios por pessoa de R$ 1.002.

“As renúncias são o novo vetor da desigualdade, porque são maiores em áreas mais ricas do país”, acrescentou o ministro José Múcio. Já Bruno Dantas, outro ministro da Corte, ressaltou que o país abre mão de tributos em volumes três vezes superiores ao déficit atual. “É preciso que o Tribunal suscite medidas mais contundentes”, disse Dantas. “O Brasil tem um encontro marcado com esses benefícios fiscais concedidos sem critério, sem análise de custo e benefício”, acrescentou

O relatório, contudo, colocou apenas ressalva sobre os casos específicos de concessão de benefícios sem os critérios da LRF ou outras legislações e recomendou a criação de um grupo de trabalho composto pelos ministérios do Planejamento, Fazenda e Casa Civil para fazer avaliação sobre os benefícios existentes. Segundo o secretário de macroavaliação governamental do TCU, Leonardo Albernaz, alguma determinação mais incisiva poderá ser feita mais à frente a partir de casos específicos que estão em análise pela Corte de Contas.

Outra ressalva às contas do governo feita pelo TCU foi de subestimação do passivo do balanço da União. Isso porque o governo não incluiu do risco de R$ 101 bilhões decorrente da derrota da Fazenda Nacional na questão que retirou o ICMS da base de cálculo do PIS/Cofins, tomada pelo governo no ano passado.

Outra ressalva importante, que acabou sendo alterada na discussão com os ministros, trata da projeção sobre as despesas com inativos militares. No ano passado, o TCU tinha exigido uma projeção de 75 anos, mas o governo entregou uma de 20 anos. Rêgo colocou que isso foi uma entrega parcial, mas estabeleceu que, se em 180 dias (inicialmente ele tinha proposto 120 dias), o governo entregar uma metodologia de projeção de déficit atuarial dos militares, independentemente de quanto tempo vai analisar, a determinação será atendida.

Ao proferir seu parecer, Vital do Rêgo, também tratou da questão do crescimento de despesas obrigatórias, como pessoal e previdência, que, nas contas do tribunal, devem fazer com que em março de 2024 as despesas discricionárias (aquelas que o governo pode alocar livremente) sejam levadas a zero, por conta da regra do teto de gastos.

Ele elogiou o dispositivo constitucional que obriga a despesa total do governo não crescer acima da inflação por 20 anos, embora tenha dito também que está estudando se não seria o caso de tirar os investimentos do limite constitucional. “Foi um remédio necessário para controlar gastos do governo”, disse, ponderando, contudo, que em 2017 a regra foi cumprida contingenciando-se despesas discricionárias, o que, se continuar nos próximos anos, levará à paralisia da máquina pública e dos investimentos. “Caso medidas estruturantes de equilíbrio fiscal não sejam efetivadas, recursos seriam só para despesa previdenciária e pessoal”, disse.

Rêgo fez o mesmo alerta sobre a necessidade de se controlar despesas obrigatórias para cumprir outra determinação constitucional, a regra de ouro das contas públicas. Ele afirmou que há risco de não cumprimento do dispositivo que determina que o governo só pode se endividar para fazer investimentos. O déficit estimado pela Corte a ser coberto na regra de ouro para este ano é de R$ 182 bilhões. “É situação de risco de governo ter que tomar empréstimo para gastos de manutenção e não para investimentos que vão beneficiar as gerações futuras”, afirmou.

 

Via Valor Econômico