Os dados de arrecadação bateram recorde no último ano em Santa Catarina. Entre 2018 e 2020 o Estado manteve um padrão de crescimento de cerca de 2 bilhões por ano. Em 2018, a arrecadação bruta foi de 25,2 bilhões, seguido por R$ 27,6 bilhões em 2019 e R$ 29,4 bilhões em 2020, pleno ano de isolamento social. Agora, no último ano, o Estado arrecadou 4 bilhões a mais do que o ano anterior, atingindo o recorde de R$ 33,4 bilhões em 2021.
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Mas, afinal, como e por que Santa Catarina bateu recorde de arrecadação em plena crise? De onde vem esse dinheiro? Quais impostos? E ainda: onde está sendo aplicada essa verba?

Em linhas gerais, três fatores principais são elencados para o ‘boom’ da arrecadação. O primeiro deles é o crescimento de caixa no mesmo ritmo da alta da inflação, que acumulou aumento de 10,06% em 2021, segundo o IPCA (Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo). O efeito das medidas fiscais em Santa Catarina, como ações de prevenção a possíveis irregularidades, também é citado como fator relevante. Por último, a retomada econômica da vida pós-lockdown, puxada pelo setor do comércio, é mais um ponto que favorece tal cenário no Estado.

Já em relação à distribuição dos recursos, houve mudança no perfil de gastos durante a pandemia. As despesas com a saúde assumiram uma proporção maior no ano de 2020. Já em 2021, foi observada um aumento da atenção para as outras áreas essenciais como educação, por exemplo.

Outro aspecto que chama a atenção é a fatia destinada aos poderes. Santa Catarina mantém o percentual fixo de 21,88% da receita corrente líquida do Estado para o duodécimo. O repasse é distribuído para 5 órgãos. O Tribunal de Justiça fica com a maior fatia: 9,41%; seguido pela Assembleia Legislativa que recebe 4,34%; Ministério Público com 3,98%; Universidade do Estado de SC (Udesc) que fica com 2,49% e Tribunal de Contas que recebe 1,66%.

Com o aumento da arrecadação, os poderes tiveram um valor maior despejado nos seus cofres.

Não houve aumento de imposto

Com o pico na inflação, a sensação é de que o contribuinte está pagando mais, entretanto não houve aumento de imposto. “O Governo do Estado não aumentou nenhum imposto neste período. Pelo contrário, tivemos redução em alguns casos, incluindo a alíquota do ICMS incidente nas operações internas com mercadorias destinadas a contribuintes para comercialização, industrialização e prestação de serviços, que diminuiu de 17% para 12% no ano passado”, explica a nota da Diretoria de Administração Tributária da Secretaria de Estado da Fazendo de Santa Catarina

Aumento do caixa seguindo a inflação

Parte da resposta que explica o fenômeno está na própria crise. De um modo geral, as arrecadações estaduais vêm de taxas e impostos, mais especificamente dos principais tributos: IPVA (veículos), ICMS (bens e serviços) e ITCMD (heranças e doações). Com o aumento da inflação, que protagonizou sustos em mercados e postos de gasolina, aumenta também, acompanhando esse processo, a cifra de arrecadação do Estado.

Em 2021, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que considera a inflação oficial do país, acumulou o aumento de 10,06%.O índice acompanha a sensação do brasileiro de que produtos e serviços, como transporte, alimentos, habitação ficaram muito mais caros.

Fonte: IBGE e Portal da Transparência de Santa Catarina (valores equivalem à arrecadação bruta que é o valor sem deduções como transferências para os municípios e o repasse ao Fundeb, entre outros…)

Quando o preço das coisas sobe, o governo acaba, por consequência, ampliando sua cifra de arrecadação, sem necessariamente aumentar a porcentagem de imposto sobre o produto ou serviço. A alíquota, ou seja, a porcentagem do imposto em cada produto, em média, se manteve, mas como o valor de tudo subiu, em decorrência de diversos fa- tores – dentre eles a crise eco- nômica e sanitária gerada pela Covid19 e aumento expressivo do dólar, e arrecadação subiu junto.

Aquecimento econômico e vida pós-lockdown

O terceiro ponto, que pode explicar porque fez com que o Estado bateu um recorde de arrecadação está, claro, no reaquecimento econômico ocorrido no último ano, com o retorno de muitas atividades. Esse é um movimento que pode ser observado em todo país, e em Santa Catarina não seria diferente. Com o abrandamento das medidas sanitárias e o retorno de praticamente todas as atividades comerciais, o catarinense saiu mais de casa, consumiu mais, o que colabora com a arrecadação na mesma proporção.

“Se a gente começa a ter mais giro, as atividades voltam a acontecer, naturalmente isso aumenta a arrecadação. É interessante pensar no caso do ICMS, que é o imposto sobre bens e serviços, quando você está numa situação de Lockdown, que as pessoas não saem, não circulam, a arrecadação desse imposto é mínima. Agora, se as atividades voltarem com tudo, a gente vai ter um volume maior de negociações de operações das quais vão incidir no ICMS, e assim a arrecadação desse imposto vai acabar sendo maior”

Laura Pacheco, economista

Fiscalização como aliada durante a pandemia

Como a inflação dá um impulso na cifra da receita de Estados ou mesmo da união, já fica claro. Mas, em Santa Catarina, mesmo descontando os índices inflacionários, o resultado é positivo, contrariando outras regiões do país, que ficaram estabilizadas ou mesmo em queda. A partir daí, podemos compreender um pouco também o efeito das medidas fiscais que foram tomadas nos últimos anos no Estado.

As ações de prevenção e fiscalização de irregularidades e fraudes podem explicar porque Santa Catarina, foi capaz manter o nível de arrecadação mesmo em um momento de crise financeira e sanitária com a pandemia. O desenvolvimento de sistemas de acompanhamento e cruzamento de dados implementaram uma estratégia de prevenção e captação dos impostos antes que eles acabem se tornando uma dívida muito grande ou exigindo auditorias que possam levar anos.

“Imediatamente quando ocorre qualquer indício de irregularidade, se entra em contato com o contribuinte em questão para oportunizar à empresa a regularização espontânea. É uma atividade com o foco muito preventivo que evita que se acumulem grandes dívidas, que acabam exigindo auditorias de longa duração e atrasando a arrecadação tributária.”

José Antonio Farenzena, presidente do Sindicato dos Fiscais da Fazenda do Estado de Santa Catarina.

Arrecadação por imposto

Fonte: CONFAZ (Conselho Nacional de Política Fazendária)

ENTENDA:

ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços): Imposto que incide sobre circulação de produtos entre municípios, estados ou de pessoas jurídicas para pessoas físicas. É um tributo estadual, ou seja, somente os governos dos estados têm competência para estabelece-lo.

IPVA (Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores): Tributo estadual arrecadado sobre automóveis, sendo por norma metade do valor destinado ao próprio estado e a outra metade ao município em que consta o registro do veículo. A alíquota varia entre 1% e 6%, o montante é determinado com base no cálculo de valor do veículo estipulado na FIPE

ITCMD (Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação): O ITCMD é um imposto de competência estadual aplicado sobre doações, transmissões de bens e distribuições não onerosas, ou seja, sempre que um bem é repassado sem cobrança ou venda, como ocorre em um processo de herança. A alíquota de arrecadação costuma variar entre 2% e 8% e incide sobre o valor do bem ou do direito transmitido.

Enquanto o combustível dispara na bomba, arrecadação do Estado tem queda gritante

De acordo com dados da ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás e Biocombustíveis), a variação do preço da gasolina na bomba, que foi de -0,6% em 2019 para 3,1% em 2020, e disparou exponencialmente para 33,8% em 2021. Taxa muito maior do que a da inflação, para se ter uma ideia, que saltou de 6,45% em 2020 para 10,06% no ano seguinte. Porém, se a sensação era de que as constantes altas no preço da gasolina iriam inflar os cofres do governo, ela é desmentida pelos números.

O valor arrecadado em 2019 foi de R$ 3,8 bi – variação de 2,59% em relação ao ano anterior. No entanto, os efeitos da pandemia da Covid-19 foram extremamente impactantes para o setor, e a arrecadação despencou para R$ 1,9 bi em 2020, uma queda de 47,6%. A retomada da economia e da circulação dos moradores provocou um salto de 9,58% em 2021, com uma arrecadação de R$ 2,1 bi, mas ainda bem longe do nível atingido pelos preços na bomba. O ano de 2021 iniciou uma série de aumentos nos valores dos combustíveis, que até hoje parecem estar longe do fim. Os motoristas começaram o ano com o combustível na média de R$ 4,49, e chegaram em dezembro pagando R$ 6,52. A variação foi de 45% em apenas 12 meses. Já em 2022, o valor de janeiro, que parecia alto, já deixa os motoristas saudosos na metade do ano. O aumento alcançou 13,45% apenas nos primeiros quatro meses.