Projeto da LDO 2019 calcula que passivo atuarial de servidores federais soma R$ 1,5 trilhão a valor presente, e descontada as contribuições, prevê um rombo de R$ 1,2 trilhão

A sociedade terá que enfrentar o dilema do próximo governo (2019-2022) de aumentar a carga tributária ou cortar despesas obrigatórias como salários do funcionalismo e aposentadorias e pensões.

Segundo os estudos do projeto da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) de 2019 que está sendo discutida pelo Congresso, sem as reformas, as projeções para as contas públicas nos próximos anos são alarmantes. Entre os números preocupantes, o déficit atuarial [acumulado de déficits anuais até o pagamento total das pensões] dos servidores públicos federais é calculado em R$ 1,5 trilhão, ao passo que o déficit financeiro [anual] crescerá de 0,77% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2019, para 0,94% do PIB em 2025.

No Regime Geral da Previdência Social (RGPS), mais conhecido como INSS, a expectativa é que o déficit financeiro avance de 2,84% do PIB em 2019, para 3,62% do PIB em 2025.

“O déficit é o principal nó da economia brasileira hoje e tende a se agravar nos próximos anos. Daí o pessimismo do empresariado de investir, com o receio do aumento de impostos”, avalia o coordenador de pós-graduação em finanças, investimentos e banking da PUC-RS, Gustavo de Moraes.

Na visão dele, a nossa sociedade terá que discutir o tamanho das despesas obrigatórias no orçamento. “O próximo governo terá que atacar, principalmente, as despesas administrativas e, consecutivamente, os altos salários e as pensões dos servidores públicos e militares”, apontou o coordenador.

Dados do último relatório fiscal do Tesouro Nacional mostraram, por exemplo, que a dotação orçamentária para investimentos é de R$ 66 bilhões para todo ano de 2018 (R$ 5,5 bilhões por mês), enquanto as despesas primárias totais alcançaram uma média de R$ 106 bilhões por mês até o final de maio. Em outras palavras, de cada R$ 100 em gastos pelo governo central, apenas R$ 5,20 são destinados para investimentos.

“O orçamento está sendo consumido em gastos correntes. Sem investimentos em saúde e educação [o básico], o Estado não gera crescimento, não gera renda e não cresce a arrecadação. Não vejo possibilidade de melhora sem a aprovação das reformas”, avaliou a economista e professora da UniDrummond, Nilza Santos Siqueira.

Para o coordenador de cursos da Faculdade Fipecafi, Valdir Domeneghetti, o Congresso Nacional terá que resistir ao forte lobby do funcionalismo público federal, e também dos estados e municípios. “Ou se vai aumentar tributos e contribuições [impostos], ou reduz despesas. Não se tem de onde tirar dinheiro”, alerta o professor.

O debate em torno da LDO 2019 no Congresso Nacional sugere a proibição de novos concursos, o adiamento de reajustes programados do funcionalismo para 2020 e até a possibilidade de remanejamento de 1,2 milhão de servidores para outras áreas de atuação. “Falta um choque de eficiência no serviço público. Mesmo que se aumente impostos, cada real arrecadado a mais irá para um governo ineficiente, será um real jogado fora”, avisa.

Domeneghetti criticou candidatos à presidência da República que estão propondo o aumento de impostos sobre grandes fortunas, heranças e dividendos. “Se taxar quem produz emprego e gera renda será um tiro no pé, o empresariado não irá investir.”

Para o coordenador do Labfin da Fundação Instituto de Administração (FIA), José Roberto Savoia, o cumprimento do teto dos gastos tende a colocar um freio na expansão dos salários dos servidores. “A negociação política será muito difícil. Mas o teto deve forçar uma política salarial mais austera nos próximos anos”, diz.

Ele também avalia que a atual carga tributária – entre 31% a 32% do PIB – já está pesada demais para a sociedade suportar novos aumentos de impostos. “Depois de um determinado patamar, a elevação nos tributos, ao invés de aumentar a arrecadação, provoca queda nas receitas”, afirma.

Savoia diz que a aprovação de uma reforma da previdência social que contemple o estabelecimento de uma idade mínima para aposentadoria também pode contribuir para que o servidor na ativa possa trabalhar por mais tempo. “Sem a reforma, vamos para uma situação insustentável que exigiria uma nova CPMF [antigo imposto sobre cheque] a cada dois anos”, argumenta.

Ele lembrou que uma parte dos servidores tem direito a paridade dos salários na ativa, enquanto os mais jovens no serviço público são beneficiados pela integralidade do último salário ao se aposentarem, que são reajustados posteriormente pela inflação. “É um estoque muito grande de beneficiários que vai perdurar por mais duas décadas”, observa o especialista.

Dito de outra forma, nesse caso de duração longa de privilégios, as sugestões às esferas de governo – federal, estadual e municipal – para equacionar o déficit é a do aumento de contribuições sobre servidores ativos e inativos.

“Os parlamentares precisam adotar uma postura mais realista. Muitos estados e municípios romperam o limite de gastos com o funcionalismo e aposentadorias. Se medidas não forem tomadas, as dificuldades tendem a se intensificar – como ocorreu no Rio de Janeiro e no Rio Grande do Sul – e comprometer a economia de suas próprias bases [eleitorais]”, considerou Savoia.

O professor de economia da Fecap, Joelson Sampaio, observa que a Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF) contempla medidas nos casos de excesso de gastos com funcionalismo público nas diferentes esferas. “A LRF prevê cancelamentos de concursos, adiamento ou reajustes menores aos servidores, cancelamentos de aumentos salariais, e até [em situações acima dos limites] a demissão de funcionários com estabilidade”, lembrou Sampaio.

Realidade vista na LDO

O projeto da LDO 2019 com 702 páginas em discussão no Congresso Nacional reúne estudos pouco divulgados pelo próprio governo. Gustavo de Moraes, da PUC-RS, citou, por exemplo, os altos salários e aposentadorias pagas pelos poderes legislativo, judiciário, Ministério Público e as pensões dos militares.

“Comparando com o INSS, é uma distribuição de renda às avessas, dos mais pobres para os mais ricos”, comentou o professor ao DCI.

Na média, aposentadorias do poder legislativo pagam R$ 26,8 mil mensais; no judiciário, R$ 18 mil; e R$ 14,65 mil no Ministério Público. Já os oficiais das Forças Armadas recebem até R$ 18 mil, aos 52 anos de idade.

Via DCI