Áreas econômica e política do governo e Congresso se acertam, mas para ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, não adianta o valor exato do corte para evitar a pedalada fiscal de Bolsonaro.

Data limite para a aprovação ou veto do presidente é dia 22

As áreas econômica e política do governo e o Congresso conseguiram chegar a um acordo sobre o Orçamento deste ano. Foi o que disse a ministra da Secretaria de Governo, Flávia Arruda, sem, porém, adiantar o valor exato do corte a ser feito para evitar o risco de uma condenação do presidente Jair Bolsonaro pelo Tribunal de Contas da União (TCU) por crime de responsabilidade fiscal. A Corte foi acionada por parlamentares, no último dia 29 de março, para dar um parecer sobre as diversas irregularidades da peça, considerada inexequível. A data limite para o presidente Jair Bolsonaro aprovar ou vetar o documento é 22 de abril.

Segundo a ministra, que ainda não tomou posse oficialmente, o acordo político foi fechado depois de uma série de reuniões entre ela, os presidentes da Câmara e do Senado, Arthur Lira (PP-AL) e Rodrigo Pacheco (DEM-MG), o relator do Orçamento, senador Márcio Bittar (MDB-AC), e integrantes da equipe econômica. Fontes do governo asseguram que foram fechadas as condições para que o governo promova um corte de pelo menos R$ 15 bilhões, além dos R$ 10 bilhões que o relator se comprometeu de reduzir dos R$ 26,5 bilhões as emendas parlamentares. Bolsonaro deixou para bater o martelo sobre o resultado das negociações a partir de hoje.

Flávia, inclusive, conversou com Bruno Dantas, ministro do TCU, relator do processo que investiga a denúncia dos parlamentares para as irregularidades no Orçamento — que ressaltaram a não priorização dos gastos com a pandemia da covid-19. E apontaram maquiagem contábil e contabilidade criativa.

Instabilidade

A área econômica já havia sugerido a Bolsonaro uma série de vetos, a fim de evitar o descumprimento das regras fiscais. As contas públicas estão no vermelho desde 2014 e a dívida pública bruta, em fevereiro, alcançou o maior patamar da história: 90% do Produto Interno Bruto (PIB), percentual bem acima da média dos países emergentes, de 50%.

Em entrevista ao Correio, publicada ontem, o ex-diretor do Banco Central e CEO e sócio da gestora Mauá Capital, Luiz Fernando Figueiredo, apontou a questão fiscal como o principal fator de instabilidade no câmbio e na confiança de investidores, que já cobram prêmios de risco cada vez mais altos para os títulos do Tesouro Nacional, e bem acima do esperado, considerando apenas o risco-país.

Ele lembrou que, por conta do desequilíbrio fiscal, resultado de um Estado inchado e que gasta 40% do PIB, o país não cresce há 15 anos. Segundo o economista, o Brasil “está à beira de um colapso fiscal” e, se negligenciar, poderá seguir os mesmos passos da Grécia de 2010.

Entre os economistas do governo, há muita insatisfação. Dizem que, com o Orçamento aprovado pelo Congresso, o Brasil caminhará rapidamente para o precipício, pois o teto de gastos e a regra de ouro, que são as últimas barreiras à derrocada fiscal, cairão. Flávia Arruda acredita, porém, que esse risco não existe mais.

Mesmo considerando um corte adicional de R$ 15 bilhões, ainda não será possível cobrir o rombo estimado pela Instituição Fiscal Independente (IFI) para evitar o estouro do teto de gastos. Pelos cálculos da entidade do Senado, há um buraco de R$ 31,9 bilhões e o limite de despesas neste ano é de R$ 1,486 trilhão. Pelos cálculos da IFI, para respeitar essa restrição, as despesas discricionárias — e que podem ser cortadas — não podem ultrapassar R$ 107,2 bilhões, mas estão orçadas no projeto aprovado pelo Congresso em R$ 139,1 bilhões.

Até então, o único aceno na tentativa de corrigir as distorções no Orçamento viera do relator Márcio Bittar. Ele recebeu sinal verde do presidente para fazer as emendas cortando gastos obrigatórios, pois Bolsonaro quer pavimentar o caminho da reeleição, em 2022, inaugurando obras pelo país.

O parlamentar turbinou os investimentos em mais de 100%. Conforme levantamento feito pela Associação Contas Abertas, após as mudanças feitas pelo Legislativo, os investimentos do governo, excluindo estatais, foi ampliado em 102,7%, passando de R$ 25,9 bilhões para R$ 52,5 bilhões — aumento de 102,7%, com os acréscimos e cancelamentos.

Como resultado das alterações, o Ministério do Desenvolvimento Regional (MDR), por exemplo, ficou com o maior volume de investimentos: R$ 16,1 bilhões. Antes, a previsão era de R$ 2,3 bilhões, um salto de 600% para a pasta comandada por Rogério Marinho — cuja previsão orçamentária foi ampliada em 158%, passando de R$ 9,1 bilhões para R$ 23,5 bilhões. E esses R$ 14,4 bilhões a mais são as emendas parlamentares com foco em obras em municípios, principalmente, no Nordeste.

Outras duas pastas também ficaram entre os destaques de maiores investimentos, deixando saúde e educação embaixo na fila de prioridades. O Ministério da Defesa, com o segundo maior orçamento de investimentos, poderá investir R$ 8,9 bilhões; o da Infraestrutura, com R$ 8 bilhões, ficou com o terceiro maior volume.

Prioridades
Enquanto isso, as previsões de investimentos dos ministérios da Educação e da Saúde, passaram de R$ 2,1 bilhões e R$ 1,9 bilhão, respectivamente, para R$ 4,1 bilhões e R$ 4 bilhões. Os recursos das duas pastas somadas (R$ 8,1 bilhões) são a metade da nova previsão do MDR, apesar de empatarem com a Infraestrutura e perderem para a Defesa.

“O Orçamento deveria espelhar as prioridades da União. Não há a mínima lógica, em um cenário agudo de pandemia, em que faltam hospitais e equipamentos, que o MDR tenha R$ 16 bilhões em investimentos e a Saúde, R$ 4 bilhões”, lamentou Gil Castello Branco, secretário-geral da Associação Contas Abertas.
Além de lamentar o fato de Educação e Saúde não serem prioridades nesse Orçamento em plena pandemia de covid-19, Fabio Klein, especialista em contas públicas da Tendências Consultoria, destacou a discrepância entre os gastos com pessoal da Educação e da Defesa. Enquanto a previsão de desembolsos com pessoal da Educação para este ano é de R$ 45,6 bilhões, o segundo maior gasto é com os servidores do Ministério da Defesa, de R$ 43,2 bilhões, que possui um contingente menor. “Sabemos que o número de professores é maior do que o de militares, em termos de capital humano. Logo, os militares acabam custando praticamente o mesmo que os professores. Isso comprova que a Educação os professores não são prioridade”, lamentou.

Via Correio Braziliense