A Justiça de São Paulo suspendeu uma cobrança de ITCMD, o imposto que incide sobre a transmissão e doação de bens, por entender que não houve coerência no cálculo dos valores da autuação fiscal aplicada a um contribuinte. O caso envolve a doação de cotas de uma empresa por uma mãe para duas filhas. Uma delas recebeu cobrança de R$ 200 mil, enquanto a outra, envolvida na ação judicial, de R$ 1,3 milhão (a quantia, atualizada, chega a quase R$ 2 milhões).

A matriarca havia dividido, ainda em vida, o seu patrimônio e cada uma das duas filhas recebeu quantidade de cotas igual e avaliada pelo mesmo valor – decorrentes de uma mesmo ato jurídico e refletidas na mesma escritura pública de doação.

Elas foram autuadas pela fiscalização, por não terem pago o imposto, com menos de uma semana de diferença. Só que estavam submetidas a delegacias de tributação diferentes. Uma na região do Butantã, na zona oeste da capital paulista, e a outra na do Tatuapé, que fica na zona leste.

A discrepância entre os valores aplicados se deu porque os fiscais das diferentes delegacias não usaram a mesma base para o cálculo do imposto. Em uma das unidades, segundo consta no processo, o ITCMD foi calculado com base no valor da doação. Já na outra, os fiscais se utilizaram do valor patrimonial da empresa que estava sob doação e, por esse motivo, ficou muito acima do outro resultado.

O juiz Marcos de Lima Porta, da 5ª Vara de Fazenda Pública de São Paulo, ao analisar o caso, afirmou que “faltou coerência quanto à atuação do Fisco e quanto ao valor do ITCMD”. Ele entendeu também que a cobrança nem poderia ser feita porque já havia se passado mais de cinco anos da doação, o que caracterizaria decadência.

O magistrado, então, suspendeu a cobrança de forma integral e impôs ao Estado o dever de emitir certidão positiva com efeito de negativa de débitos. A decisão foi proferida em caráter liminar (processo nº 1050485-95.2018.8.26.0053).

“Eu nunca tinha me deparado com uma situação dessa. De um mesmo ato jurídico, a mesma escritura de doação, resultar em cobranças tão diferentes”, diz Marcelo Escobar, do escritório Escobar Advogados, representante do contribuinte no caso.

A falta de critérios, acrescenta, não foi percebida somente na fiscalização. O advogado chama a atenção que esse caso foi discutido no Tribunal de Impostos e Taxas (TIT) de São Paulo, que julga de forma administrativa as autuações estaduais, e, inclusive, com análise da Câmara Superior. A autuação contra o contribuinte, segundo ele, foi mantida mesmo havendo enorme diferença entre uma e outra cobrança.

No TIT, os julgadores também analisaram a questão da decadência e, diferentemente do Judiciário, entenderam que o prazo começa a contar um ano depois da data de doação, em razão da declaração do Imposto de Renda do contribuinte. Nesse ponto, no entanto, a argumentação do contribuinte é a de que o Estado teve ciência da doação já no momento em que foi feita porque tratava-se de escritura pública, com registro em cartório.

A Procuradoria-Geral do Estado (PGE) informou por meio de nota ao Valor que a Secretaria da Fazenda foi citada ontem e irá providenciar a contestação e defesa do auto de infração aplicado pela fiscalização ao contribuinte.

Fonte: Valor Econômico