Indio Zavarizi, filiado Sindifisco é responsável pelo grupo que analisa as leis sobre finanças, tributação e orçamento.
Veja abaixo a integra da matéria publicada no Diário Catarinense, edição de domingo (04/03):
Força-tarefa faz varredura nas leis de Santa Catarina
Objetivo é consolidar tudo que foi aprovado pelos deputados estaduais desde 1947
Imagine a cena: os deputados estaduais acabam de aprovar o projeto que altera uma lei em vigor e um estagiário de Direito aborda o presidente da Assembleia Legislativa para dizer que a lei original não podia ser alterada porque já havia sido extinta anos antes. A situação poderia estar em um romance do escritor Franz Kafka, mas foi no plenário do parlamento catarinense.
Desde 1947, cerca de 19,3 mil leis foram aprovadas pelos deputados estaduais, formando um complicado emaranhado de regras – muitas em desuso – que confunde o próprio trabalho dos parlamentares e da Justiça na hora de aplicá-las.

Foi o alerta do estagiário que fez o presidente Gelson Merisio colocar em prática uma tentativa de consolidar a legislação. Após análise de tentativas semelhantes em outros estados e municípios – caso, por exemplo, da cidade de São Paulo –, a AL contratou um grupo de 10 professores doutores da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) para organizar as leis estaduais em um código mais simples.

O trabalho, coordenado pelos professores Rafael Peteffi da Silva e Orides Mezzaroba, começou em fevereiro de 2010 e deve ser concluído até o final do ano. O custo total dos 24 meses de contrato é de R$ 4,3 milhões, envolvendo os custos do projeto, a contratação de 40 pesquisadores e um curso de pós-graduação que será oferecido aos advogados da AL para que as futuras leis sigam o modelo definido após a consolidação.

—O volume de trabalho é muito grande para ser feito pela casa. Em outros lugares, a consolidação esbarrou nisso. Se fosse feito pelos nossos advogados, seria um trabalho a mais e acabaria não avançando— afirma Merisio.

O trabalho se divide em três partes (confira no infográfico). Em agosto, será concluída a primeira, com a organização de todas as leis atuais em sete grupos temáticos e a definição da metodologia para os próximos passos: a sistematização e a consolidação das leis.

— Na sistematização, organizamos o que já existe, mas que ninguém se acha. Nosso juízo de valor é muito pequeno. Elenca-se o que está em vigor, o que é inconstitucional, o que sofreu ação de inconstitucionalidade, o que foi revogado. Pode-se fazer correção de texto, monetária, corrigir alguma ambiguidade— explica Peteffi.

O trabalho deve ser concluído em novembro. Aí, o grupo se concentra na consolidação propriamente dita – que é quando as leis em vigor serão cruzadas para serem agrupadas e terem os textos simplificados.

Desse trabalho, sairá o esboço da Consolidação das Leis Catarinenses (CLC), que deverá ser votado em plenário até o fim do ano. Aprovada, ele substitui todas as leis do Estado. Além de facilitar a vida de parlamentares, advogados e magistrados, a consolidação também será importante para o cidadão comum. É o que garante Peteffi:

— Imagina um cidadão que é funcionário público e quer saber quais são seus direitos. É um emaranhado tal de leis que é muito dificil ele conseguir se achar sem a ajuda de um especialista. Às vezes até mesmo com o especialista— afirma o professor.
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Tendência é redução drástica
Embora tenham sido pesquisadas outras tentativas de consolidação das leis em assembleias legislativas e câmaras de vereadores espalhadas pelo país, o trabalho feito em Santa Catarina precisou criar parâmetros próprios. Isso porque nenhum dos modelos encontrados chegou ao objetivo final.
Na cidade de São Paulo, por exemplo, um projeto de consolidação das leis chegou a ser apresentado em 2005 – ainda na gestão de José Serra na prefeitura.
Estavam previstas duas etapas: a simples eliminação de leis caducas e a redução de 14 mil para 2,5 mil das que estavam em vigor. A primeira parte saiu do papel, com a extinção de cerca de 3,6 mil leis editadas entre 1892 e 1947 – entre elas a que proibia estábulos na região central da cidade ou a que obrigava a identificação das sepulturas de criminosos célebres. A segunda parte da consolidação acabou ficando na intenção.
A comissão externa contratada especificamente para o projeto é a principal diferença do modelo catarinense para o paulistano. Lá, o trabalho ficou a cargo de 11 juristas da Câmara e oito da prefeitura.
– O maior trabalho foi justamente criar a metodologia. Não tínhamos um modelo teórico a seguir e precisamos criar um. É pioneirismo catarinense – afirma Rafael Peteffi da Silva.
Mas nem tudo precisou ser inventado. Uma lei federal e duas leis estaduais regulamentam como devem ser feitos os textos legais e os processos de consolidação de leis.
Isso vai fazer com que a legislação catarinense ganhe uniformidade após o trabalho da equipe da UFSC. As diferenças no estilo dos textos legais conforme as épocas já foram percebidas pelos pesquisadores.
– Antes era a vontade de quem estava com o poder. A gente olhava e sabia: “Quem redigiu a lei foi fulano” – brinca o professor Indio Zavarizi, responsável pelo grupo que analisa as leis sobre finanças, tributação e orçamento.
Ao contrário do projeto paulistano, que estipulava uma meta de numero de leis ao final da consolidação, os catarinenses preferem não arriscar. Mas as intenções apontam para uma redução drástica.
Na área tributária, por exemplo, toda a legislação sobre o antigo Imposto de Circulação de Mercadorias – reformulado após a Constituição de 1988 – deve sumir. Leis sobre temas semelhantes, como títulos a cidades do interior e declaração de utilidade publica a entidades, serão agrupadas.
– Em vez de centenas de leis declarando entidade de utilidade pública, poderia ser uma lei só. Cada projeto incluiria novas entidades nessa lei existente. As que vierem a ser declaradas após a consolidação podem ser incluídas no texto dessa única lei – imagina o presidente Gelson Merisio.
Fonte: DC – 04/03/2012