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Entidades ligadas à indústria demonstram preocupação com a redução dos benefícios fiscais concedidos a empresas catarinenses nos próximos quatro anos. O novo teto para as isenções está na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), sancionada pelo governador Eduardo Pinho Moreira nesta semana. Consideradas como fator importante na competitividade, alegam que mudanças nas renúncias já impactam investimentos e devem afetar custo e empregos. Por outro lado, especialistas defendem que a medida é importante para o equilíbrio fiscal.

De acordo com a lei, a fatia de isenções terá que comprometer no máximo 16% da arrecadação do Estado até 2022. Só neste ano, o executivo deve abrir mão de R$ 5,8 bilhões em tributos para empresas instaladas em solo catarinense, o equivalente a 25% da arrecadação em impostos estaduais (IPVA, ICMS e ITCMD).

Daqui a quatro anos, o governo terá que conceder, no máximo, R$ 4 bilhões em benefícios.

Com a redução gradativa – 1,6% a cada ano –, a renúncia fiscal prevista na LDO para o próximo ano, que seria R$ R$ 5,9 bilhões passa para R$ 5,5 bilhões, diferença de R$ 400 milhões.

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O setor têxtil e de vestuário, o principal beneficiário em SC – a LDO prevê R$ 1,1 bilhão de isenções para a área em 2019 – já sente os efeitos da aprovação da lei. De acordo com o presidente do Sindicato das Indústrias de Fiação, Tecelagem e do Vestuário de Blumenau (Sintex), José Altino Comper, os empresários seguraram os investimentos para aguardar as definições de onde serão feitos os cortes dos incentivos.

– Muita gente acredita que o valor da redução fica com o empresário, o que é um engano. Isso torna o produto mais barato para o consumidor e gera competitividade. O que for mexido vai impactar no preço, porque o custo vai aumentar – diz.

A agroindústria é o segundo segmento que mais recebe benefícios fiscais no Estado. O diretor-executivo do Sindicato da Indústria de Carne e Derivados em SC (Sindicarne), Ricardo de Gouvêa, acredita que, se houver redução de incentivos, o custo de produção vai aumentar.

– Não sou contra a redução, mas tem que analisar como e onde vai fazer. A agroindústria tem um impacto socioeconômico muito grande em Santa Catarina, porque ela movimenta uma cadeia produtiva. Tem toda a parte de produção, de transportes. Onde ela está acaba movimentando demais setores, como comércio – defende.

Em nota, a Federação das Indústrias de SC acrescenta que os benefícios fiscais são “respostas do Estado a políticas de atração de investimentos adotadas em outras regiões” e que a redução pode afetar a competitividade e, por consequência, a geração de empregos no Estado. Por isso deve ser realizada “com cuidado”.

O secretário da Fazenda estadual, Paulo Eli, garante que as medidas serão adotadas depois de avaliação e não devem impactar a economia catarinense, já que em um primeiro momento estariam focadas em “produtos supérfluos”.

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Deputado acredita em economia de R$ 2 bilhões

A  Federação do Comércio de Bens, Serviços e Turismo (Fecomércio SC) reforça que a lei pode impactar principalmente nos produtos importados, que podem ter um aumento de preços e migração de empresas importadoras para outros Estados.O deputado estadual Marcos Vieira (PSDB), autor da emenda que estabelece o teto para as renúncias fiscais, acredita que a medida deve dar condições de trazer aos cofres públicos quase R$ 2 bilhões em quatro anos:– Tem segmento que está há 10, 12, 15 anos com renúncia fiscal. A isenção tem que ser concedida atendendo alguns pressupostos.

Especialistas criticam falta de transparência e comprovação de retorno

Tanto o Tribunal de Contas da União (TCU) quanto especialistas questionam o alto valor das isenções no país. De acordo com o professor da Fundação Getúlio Vargas Sérgio Luiz de Moraes Pinto, somada a isso está a falta de comprovação de que elas realmente trazem retorno para os cofres públicos.

– Um exemplo (em Santa Catarina) é o programa de desenvolvimento, o Prodec. Ele passou a dar incentivo para as empresas que se concentram na região mais rica do Estado. A gente precisa pesar o quanto de benefício esse programa trouxe efetivamente. Muitas vezes, é para companhias já implantadas, então você nem traz investimento. Outras vezes precisa criar infraestrutura para a implantação da fábrica. Tem que pesar o retorno do incentivo. Quanto emprego gerou?

Moraes acredita que a redução de benefícios fiscais aprovada em Santa Catarina ocorrerá em outros Estados. Ele acrescenta que os governadores eleitos em outubro terão de repensar toda a política de incentivo.

O secretário-geral da ONG Contas Abertas, Francisco Gil Castello Branco Neto, acrescenta que o incentivo é recomendável quando o governo precisa incrementar determinado setor ou atividade por um período. Mas aponta que os subsídios são crescentes no país e não são reavaliados para que seja possível mensurar o resultado financeiro.

TCU considera patamar da união preocupante

O professor do departamento de Economia da Esag/Udesc Arlindo Rocha pondera que a criação de um teto para as renúncias fiscais é importante, mas precisa ser bem estudada para não ocorrer uma crise social, com empresas demitindo por causa do aumento de despesas.

– Tem muita gente que depende disso. Você pode cortar gastos desnecessários, mas também pode tirar de quem precisa. Tem que se fazer uma grande análise – diz.

Rocha acrescenta, no entanto, que não é papel do governo subsidiar empresa determinadas e defende que sejam feitos investimentos em programas para aumentar a produtividade, por exemplo.

– Se a empresa não tem competência de continuar, ela tem que se modernizar – afirma, ao criticar os subsídios.

Em relatório divulgado em junho, o Tribunal de Contas da União criticou o volume de gastos tributários (20,7% do arrecadado no país), o que considerou um patamar preocupante diante da crise financeira das contas públicas.

“Destaca-se que esse montante significativo de renúncias de receitas tributárias impacta a capacidade financeira do Estado para financiar as políticas públicas inseridas no orçamento da União”, destacou o órgão no relatório.

Entrevista

“Vamos mexer só em itens de consumo final”

O secretário de Estado da Fazenda, Paulo Eli, reforça nesta entrevista que uma comissão  avaliará de quais setores serão reduzidos os benefícios, mas garante que não haverá impactos na geração de empregos ou atração de empresas para Santa Catarina.

Quais setores serão mais impactados pela redução da isenção fiscal?

Ainda temos cinco meses para definir isso. Na proposta orçamentária, já temos que prever isso, mas a gente tem até 31 de dezembro para modificar a legislação e trabalhar essa questão.

Mas haverá impactos para indústrias locais e empregos?

Não. Neste ano, tiramos benefícios de bacalhau, salmão e importados. Só em itens de consumo final que a gente vai mexer, nos supérfluos. Filé mignon tem benefício fiscal, nisso a gente deve mexer. Não vai impactar nada na economia, por isso tem uma comissão estudando a questão para preservar a competitividade das empresas de Santa Catarina.

Na agroindústria e na indústria têxtil catarinense deve haver impactos?

Nada vai ser mexido. Basicamente, vamos focar em produtos supérfluos.

Como será feita a avaliação?

A gente já tem uma comissão montada desde o início do ano, porque já estamos num processo de convalidação dos benefícios em função da lei complementar 160 do governo federal. Já temos uma comissão trabalhando. Agora, temos até dezembro para fazer essa reavaliação.

Este é o momento econômico ideal para fazer essa redução de benefícios?

A renúncia fiscal vai ficar limitada a R$ 4 bilhões nos setores onde o Estado precisa gerar competitividade. Nos itens em que não há essa necessidade, vamos reavaliar. Será um trabalho muito criterioso, não vai ter impacto na geração de empregos, e toda essa questão de atração de empresas vai continuar, porque temos uma margem grande de renúncia de R$ 4 bilhões para trabalhar. No Prodec (Programa de Desenvolvimento da Empresa Catarinense), a empresa capta o projeto e depois volta a pagar normal. Os benefícios não podem ser ad aeternum (eternamente) também. A secretaria já faz uma avaliação todo ano e agora vamos respeitar esse teto. Tem muita renúncia que não gera arrecadação, porque se não fizer um trabalho bem feito as empresas podem ir embora. Então, vamos primeiro focar nos produtos supérfluos.

 

ViaJornal Diário Catarinense