Antonio Gavazzoni, secretário de Estado da Fazenda e doutor em Direito Público
contatogavazzoni@gmail.com

A União concederá desconto sobre os saldos devedores das dívidas dos Estados. Isto é o que diz o artigo 3o da Lei Complementar nº 148/2014, base da Tese de Santa Catarina. A lei foi clara e direta: aplique-se o desconto. Durante a tramitação do projeto na Câmara e no Senado, não apareceu ninguém do Governo Federal para levantar a questão sobre qual Selic seria usada na conta, que poderia considerar a soma ou a multiplicação das taxas mensais. É lógico que, para os Estados, se o objetivo era dar desconto, o método seria pela conta que mais favorecesse ao devedor. Ocorre que depois, via decreto, a mesma União resolveu reinterpretar a legislação, aplicando a taxa Selic multiplicada e composta, com efeito geométrico explosivo sobre as dívidas dos Estados devedores.

Assim nasceu o imbróglio que hoje divide a Federação em duas correntes: de um lado estão os Estados e uma conta a pagar que só fez alargar-se durante quase 20 anos pela sobrecarga de juros elevados. Do outro lado, a União, disposta a não ceder ao que classifica de demandas irresponsáveis dos devedores, ameaçando-os com a implosão das finanças federais em função do cálculo legal do desconto concedido legalmente.

Nas últimas duas décadas, sob a desculpa de que juros altos “combatem” a inflação (isso quase nunca é verdade), o País se tornou a pátria dos juros escorchantes, em que o peso da usura sempre recai sobre o setor produtivo e os Estados e Municípios, responsáveis por oferecer os serviços básicos à população. E a União acabou virando vítima do próprio veneno da política de juros altos. Prova disso é quanto pagou em 2015 de juros, ao amargar R$503 bilhões em encargos financeiros, valor equivalente a 20 Copas do Mundo!

Nenhum país pode sobreviver nesse ambiente contaminado de juros sobre juros. Esta é a questão que desvia a verdadeira discussão nessa demanda sobre a taxa aplicável sobre os juros pretéritos pagos pelos Estados. Interlocutores do Ministério da Fazenda desfilam argumentos terroristas sobre a quebra da União e a desconfiança dos mercados nos papéis públicos – como se o Governo Federal já não estivesse em situação de haver perdido seu grau de investimento e como se já não enfrentasse a maior onda de desconfiança sobre si mesma.

A Federação precisa ser refundada, em termos mais sérios e confiáveis. Ao interpelar a União no Supremo Tribunal Federal, Santa Catarina não buscou vantagem indevida. O objetivo foi apenas obter o remédio da própria lei. Os brasileiros são os que, no fim da linha, têm pagado tudo de bico calado, todos esses anos. É em nome dos contribuintes de Santa Catarina e do Brasil que procuramos colocar ponto final nesse circuito.

É uma honra para Santa Catarina liderar tal processo. Temos nossa casa em ordem. Não vamos quebrar nem queremos que ninguém mais nos cobre juros de mau devedor. Aceitamos, sim, negociar, desde que nossas responsabilidades estaduais como governo sejam compatíveis com uma nova estrutura de repartição de tributos, simplificada e com prioridade para os gestores estaduais.

A União deve se conter nos seus meios, parar de sonhar com novos tributos e se organizar para gastar apenas sobre o que arrecada. Assim pagará juros normais e haverá de ser exemplo – hoje não dá nenhum – para a maioridade fiscal e financeira dos seus Estados e Municípios.

 

Via Adjori/SC